::Other Languages ::

sábado, 23 de novembro de 2013

Plano de Saúde e Reajuste por Aumento de Sinistralidade

Os contratos de plano de saúde coletivos/ empresariais prevêem, em regra, o reajuste no valor das mensalidades (atualização) em três situações distintas: a) com base na variação dos custos e serviços ocorrida nos últimos 12 (doze) meses; b) em face da alteração do nível de sinistralidade (reavaliação dos custos nos últimos 12 meses); c) por ocasião da mudança da faixa etária (consoante tabela estabelecida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar -ANS).

O aumento da sinistralidade diz respeito ao desequilíbrio econômico-financeiro causado pelo uso excessivo das benesses do contrato por parte do grupo de beneficiários (receitas < despesas), o que, em alguns casos, pode gerar a rescisão da avença por impossibilidade de sua manutenção, face a onerosidade excessiva imputada à Operadora do plano de saúde. É de salientar que tal hipótese somente poderá ocorrer em se tratando de plano coletivo (logo, envolvendo duas empresas), bem como a possibilidade de cancelamento deverá estar necessariamente prevista em cláusula contratual, a qual disporá ainda sobre o período de aviso prévio.

Importante dizer que, assim como outras modalidades de contratos, os que versam sobre plano de saúde possuem como características a onerosidade e a comutatividade, ou seja, envolvem o dever de prestação (serviços) e contraprestação (pagamento). O valor inicial das parcelas dos planos coletivos é calculado com base em dados genéricos e técnicas atuariais - análise do número de integrantes, idade, doenças e lesões preexistentes - donde se extrai um quantum estimativo. Somente no decorrer da contratação é que se terá uma noção do histórico clínico da carteira de beneficiários, quando o plano então buscará uma readequação do valor das parcelas para fins de restabelecer o equilíbrio/ equivalência nas prestações.

Todavia, recentemente o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao analisar recurso que versa sobre a matéria, entendeu pela NULIDADE da cláusula contratual do plano de saúde que prevê a possibilidade de reajuste do valor da mensalidade com base na sinistralidade. Nos termos do acórdão proferido pela Sexta Câmara Cível, não é dado ao fornecedor do serviço aplicar o reajuste de modo unilateral, o que configuraria abusividade, já que existe a possibilidade de manipulação dos dados por parte da empresa, através da criação de despesas.

No caso concreto, a Operadora foi condenada a devolver, na forma simples, os valores indevidamente cobrados a maior desde 2011.


EMENTA DO JULGADO:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DE MENSALIDADE EM RAZÃO DA SINISTRALIDADE. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO SIMPLES. PRESCRIÇÃO TRIENAL. REAJUSTE ANUAL CONFORME O CONTRATADO. POSSIBILIDADE. Trata-se de ação de revisão de contrato de plano de saúde, na qual a parte autora objetiva a declaração de nulidade das cláusulas contratuais que prevêem reajustes abusivos nas mensalidades, julgada improcedente na origem. REAJUSTE ANUAL - No que guarda relação com o reajuste anual, viável a livre negociação do índice entre as partes, uma vez que inexiste interferência da ANS no cômputo do reajuste anual dos contratos coletivos, assim como inexiste desigualdade na relação jurídica a ponto de nulificar a cláusula contratual que estipula o índice, eis que, nesses casos, o consumidor possui maior poder de negociação. O papel da autarquia reguladora nos contratos de plano de saúde entabulados coletivamente consubstancia-se apenas em monitorar os índices praticados pela operadora, de forma que o reajuste deve ser previamente comunicado à ANS, não obstando a livre negociação do reajuste entre as partes, desde que não ultrapassem àqueles previstos contratualmente e não se configurem manifestamente abusivos. REAJUSTE POR SINISTRALIDADE - A prática de reajustes com base na planilha de custos e desempenho, ou seja, na sinistralidade, vai de encontro às disposições do Código de Defesa do Consumidor, mormente porque essa condição, além de impedir o conveniado de ter, no ato da contratação, a noção exata de quais serão os seus ônus, também possibilita a manipulação dos dados pela operadora, de modo a forçar a majoração artificial de preços, em clara ofensa ao artigo 51, inciso X e § 1º, e incisos I e II, do CDC. Embora haja a possibilidade de a operadora reajustar os valores dos prêmios mensais, deve-se reconhecer a abusividade em conferir ao fornecedor o poder de apreciar unilateralmente a majoração a ser aplicada, tal como ocorre quando do aumento das mensalidades em razão da sinistralidade. Aplicação da regra disciplinada pela Instrução Normativa nº 49 da ANS, de 17/05/2012. Precedentes. REPETIÇÃO DOS VALORES - É possível a repetição do indébito de forma simples, em atenção ao princípio que veda o enriquecimento indevido do credor. Precedentes. PRESCRIÇÃO - A matéria relativa ao prazo prescricional das parcelas que devem ser restituídas por indevidas, nas ações como a "sub judice", restou sedimentada neste órgão fracionário como sendo trienal "ex vi legis" do art. 206, §3º do CC/2002. Precedentes. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70056483696, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 24/10/2013). GRIFO NOSSO.
____________________________________________________


Código de Defesa do Consumidor:

Artigo 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...)
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;

§ 1.º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.


Instrução Normativa n.º 49 da ANS:

Art. 5.º- É vedada cláusula de reajuste baseada em:
I - formas de reajuste condicionadas à sinistralidade da operadora;

sábado, 9 de novembro de 2013

CDC e a Cobrança Indevida de Tarifas nas Faturas do Cartão de Crédito

Não são raros os casos de consumidores que, ao receberem a fatura mensal do cartão de crédito, são surpreendidos pela cobrança de tarifas cuja origem desconhecem e que nem sempre são objeto de questionamento junto à operadora.

Uma dessas rubricas é a "AVAL. EMERG. CREDITO" (avaliação de viabilidade e de riscos para a concessão de crédito em caráter emergencial), que em outras palavras se trata de uma tarifa cobrada com o intuito de promover a ampliação do crédito para o consumidor, sempre que este ultrapassar o limite do cartão, a qual poderá ser cobrada uma vez a cada 30 (trinta) dias.

Ocorre que referida ampliação do crédito - com a consequente cobrança de tarifa - somente poderá ser concedida a pedido do cliente, nos termos da Resolução n.º 3.919/2010 do BACEN (Banco Central do Brasil), que assim determina:
 
Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.
 
 Segundo as normas comuns aplicadas a todas as operadoras que atuam no mercado, o consumidor só poderá utilizar seu cartão de crédito até o limite que lhe foi previamente disponibilizado. Em sendo ultrapassado este limite, o procedimento correto é de negar sua utilização, SALVO, como já referimos, pedido expresso do cliente à instituição financeira no sentido de autorizar a realização de operações acima do limite do cartão, com a consequente cobrança de tarifa.

Na prática, porém, o que se vê é a disponibilização de crédito e cobrança de tarifas sem a solicitação, e muitas vezes sem nem mesmo o conhecimento do cliente, em completa contrariedade ao que determina o Código de Defesa do Consumidor, especialmente no que diz respeito ao direito à informação (artigo 6.º, inciso III da Lei n.º 8.078/90).

Ademais, tal conduta pode ser classificada como ABUSIVA, uma vez que é expressamente vedada pelo CDC em seu artigo 39. Vejamos:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
(...)
III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;
(...)
Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.

 
Aplica-se, assim, a norma contida no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Importante referir que, além do direito do cliente/ consumidor a receber em dobro os valores indevidamente inseridos em sua fatura (conforme determina o artigo 42, parágrafo único, da Lei n.º 8.078/90), poderá também postular uma indenização por dano moral, em sua modalidade in re ipsa, uma vez que os danos são presumidos em virtude da violação dos deveres anexos à boa-fé objetiva (transparência, lealdade, clareza).