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terça-feira, 26 de abril de 2022

Vínculo de Emprego entre Uber e Motorista

Em recente e inédita decisão exarada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), os Ministros da 3.ª Turma reconheceram o vínculo empregatício entre o aplicativo Uber e um motorista que trabalha para a empresa de plataforma digital que arregimenta, organiza, dirige e fiscaliza a prestação dos serviços especializados de transporte.

Conforme a decisão, estão presentes todos os requisitos de uma relação de emprego: pessoa humana prestando trabalho; com pessoalidade; com onerosidade; com não eventualidade; com subordinação. Consoante dispõe a CLT:

Art. 3.º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Art. 6.º Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.                      
Parágrafo único.  Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.          

Com a crescente onda de desemprego no Brasil, que aumentou drasticamente no período mais crítico da pandemia de Covid-19, as pessoas passaram a buscar fontes alternativas de renda, de modo a tentar garantir (ainda que minimamente) a sua subsistência. Nesse cenário, surge o fenômeno da uberização do trabalho - conceito derivado de Uber, cujas características são a informalidade, a flexibilidade de jornada e de horários, a autonomia nas tarefas e a prestação de serviços por demanda. Ou seja: a liberdade passa a ditar todas as regras, em que o prestador do serviço de mão de obra escolhe se, quando, onde e como trabalhar.

Porém, sinônimo de uberização é a palavra precarização. Sem vínculo de emprego formal, o prestador de serviços não dispõe de uma série de direitos e garantias trabalhistas que a carteira assinada traz: salário mínimo, horas extras, férias, décimo terceiro salário, adicional noturno, recolhimento de FGTS, entre outros. 

A decisão do TST configura importantíssimo precedente no país, em que a "regra" vinha sendo o reconhecimento da informalidade da prestação de serviços como o de motorista de carros (Uber, 99, Cabify) e de motocicletas, e aqui mencionamos os entregadores de alimentos (iFood, Rappi), em que as demandas (nem sempre ocasionais) são oferecidas através de plataformas digitais. 

Conforme consta literalmente da ementa do acórdão de Relatoria do Ministro Maurício Godinho Delgado, 

(...) a prestação de serviços ocorria diariamente, com sujeição do Autor às ordens emanadas da Reclamada por meio remoto e telemático (art. 6º, parágrafo único, da CLT); havia risco de sanção disciplinar (exclusão da plataforma) em face da falta de assiduidade na conexão à plataforma e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros da Reclamada; inexistia liberdade ou autonomia do Reclamante para definir os preços das corridas e dos seus serviços prestados, bem como escolher os seus passageiros (ou até mesmo criar uma carteira própria de clientes); não se verificou o mínimo de domínio do trabalhador sobre a organização da atividade empresarial, que era centralizada, metodicamente, no algoritmo da empresa digital; ficou incontroversa a incidência das manifestações fiscalizatórias, regulamentares e disciplinares do 
poder empregatício na relação de trabalho analisada.


 

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Reajuste por Faixa Etária em Plano de Saúde Coletivo

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça fixou duas teses sob o rito dos recursos repetitivos  no sentido de validar o reajuste por faixa etária dos beneficiários de contratos de plano de saúde coletivos, desde que observados alguns requisitos, a saber: a) haja previsão contratual; b) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores; c) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.

Importante dizer que as condições acima elencadas foram fixadas por ocasião do julgamento do Tema 952, concernente aos planos de saúde individual ou familiar.

A cláusula de reajuste das mensalidades por faixa etária é objeto de milhares de demandas judiciais em tramitação no país, uma vez que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) impõe limites apenas aos contratos de plano de saúde individuais e familiares, não dispondo regras aos coletivos empresariais - o que, na maioria das vezes, acarreta aumentos acentuados, abusivos e ilegais.

Vale lembrar que o princípio da boa-fé objetiva veda a onerosidade excessiva do consumidor, bem como a existência de cláusulas de caráter eminentemente discriminatório que causem desequilíbrio entre as partes - de modo a inviabilizar a permanência de beneficiários idosos no plano de saúde, considerados hipervulneráveis no mercado de consumo, e que mais utilizam e se submetem a consultas, exames, procedimentos e/ou internações.

Assim, o Tema 1.016 fixou as seguintes teses:

1) Aplicabilidade das teses firmadas no Tema 952 aos planos coletivos, ressalvando-se, quanto às entidades de autogestão, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC);

2) A melhor interpretação do enunciado normativo do artigo 3º, II, da Resolução 63/2003 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é aquela que observa o sentido matemático da expressão "variação acumulada", referente ao aumento real de preço verificado em cada intervalo, devendo-se aplicar, para sua apuração, a respectiva fórmula matemática, estando incorreta a simples soma aritmética de percentuais de reajuste ou o cálculo de média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias.


domingo, 3 de abril de 2022

Responsabilidade Profissional do Corretor de Imóveis

O Corretor de Imóveis é figura importantíssima na realização do sonho da grande maioria das pessoas em idade adulta: a aquisição da casa própria. Dada a relevância social dessa nobre profissão - que envolve a captação, a divulgação e a negociação de imóveis - destacamos aqui alguns direitos e deveres do técnico em transações imobiliárias, que, dentre outros compromissos, deverá exercer a profissão com zelo, discrição, lealdade, probidade e boa-fé.

Tendo como principal função intermediar as negociações entre comprador e vendedor da propriedade, cabe ao Corretor zelar pela integridade da transação imobiliária, executando a mediação com diligência e prudência, além de proatividade. 

O profissional deverá buscar todas as informações acerca do bem e inteirar-se de todas as circunstâncias do negócio antes de ofertá-lo. Seu dever é de apresentar dados rigorosamente certos e prestar esclarecimentos de forma espontânea, correta, clara e transparente, jamais omitindo detalhes que depreciem a transação. Há de informar sobre a segurança do negócio, bem como alertar acerca de eventuais riscos e circunstâncias que possam comprometer a sua realização, especialmente no que diz respeito a possíveis causas de anulação. Ademais, o Corretor deverá recusar a transação que saiba ser ilegal, injusta ou imoral.

O Corretor de Imóveis tem o dever de assistência, obrigando-se a acompanhar os clientes em todas as fases, até o desfecho do negócio - registro da compra e venda no Registro de Imóveis. Não basta cadastrar o imóvel no site ou redes sociais da imobiliária, dando visibilidade ao bem: é preciso despender esforços para que a compra e venda se concretize. Assim, o profissional deve ser um verdadeiro canal de aproximação entre as partes, e zelar para que a transação seja favorável a ambas. 

Eventual responsabilidade na conduta será apurada nos termos do Código de Ética Profissional dos Corretores de Imóveis (Resolução COFECI n.º 326/92), e poderá se dar nas esferas civil e penal, sempre que seus atos causarem danos ao cliente por dolo ou culpa (nas modalidades de imperícia, imprudência ou negligência).

A depender do caso, é possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, em especial no que tange à publicidade dos imóveis oferecidos para aluguel ou venda: esta deverá noticiar com fidelidade os dados concernentes às características essenciais do bem, e veicular todas as informações imprescindíveis ao negócio, como valor e forma de pagamento. Ou seja, o anúncio não pode ser omisso, tampouco enganoso, capaz de induzir a erro o consumidor (hipossuficiente e vulnerável).

Já tratamos aqui no BLoG acerca da Comissão de Corretagem e Comissão de Corretagem Indevida (clique nos links para ler). Relativamente à remuneração do profissional que efetuará a transação imobiliária, é necessário informar previamente ao comprador sobre a taxa de corretagem, ainda que seja no mesmo dia do fechamento do negócio. Ou seja, o adquirente deverá ser avisado do preço total da aquisição com destaque para o valor da comissão, de modo a que o consumidor não seja surpreendido - acreditar que a taxa já está embutida no preço, e posteriormente ficar sabendo da cobrança em apartado (e adicional), aumentando o valor total.

Por outro lado, importa consignar que o Corretor de Imóveis não responde por eventual descumprimento das obrigações assumidas contratualmente pelas partes, como o inadimplemento das parcelas na compra e venda de imóvel, dos alugueis mensais na locação, atraso na entrega/ devolução de chaves, etc.