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quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Boas Festas!!!

2020 foi um ano singular. Para alguns, motivo de marasmo e reclamação. Para outros, oportunidade de crescimento e superação. 2020 teve a cara que cada um deu a ele. Foi um ano difícil, doloroso, de medo e preocupação. Mas também foi um ano de fé, esperança, aprendizado e reinvenção. Foram 365 dias em que as maiores e mais belas lições vieram da empatia, do perdão, da solidariedade e da união. Que 2021 venha com a promessa de ser mais leve e mais bonito. Que a ALEGRIA seja nossa companheira constante, que a LUZ ilumine nossos caminhos e que o AMOR inunde e acalente nossos corações. 

BOAS FESTAS!!!







quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

VACINA: Opção Individual ou Obrigação Coletiva?

Em 17 de dezembro passado, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da vacinação compulsória no país. Conforme entendimento da maioria dos Ministros, o Estado pode determinar a obrigatoriedade da imunização de toda a população, inclusive contra a Covid-19. 

Entretanto, não é possível lançar mão de medidas invasivas (como o uso da força) para tanto, mas apenas medidas indiretas - a serem impostas pela União, Estados e Municípios -, como a aplicação de multa, restrição da presença em certos lugares ou o exercício de determinadas atividades àqueles cidadãos que se recusarem a serem vacinados contra a Covid-19.

Com relação às crianças e adolescentes, restou definido que, independentemente de suas convicções morais, religiosas ou filosóficas, os pais são obrigados a levar seus filhos menores para serem vacinados, em observância ao calendário de imunização determinado pelas autoridades sanitárias. Neste caso, o Poder do Estado se sobrepõe ao poder familiar dos genitores e/ou responsáveis legais.


TESES FIXADAS PELO STF

 

Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587:


(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, facultada a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade; e sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente.

(II) Tais medidas, com as limitações expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.

 

Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1267879:


“É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, tenha sido incluída no plano nacional de imunizações; ou tenha sua aplicação obrigatória decretada em lei; ou seja objeto de determinação da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”.


Aqui no BLoG, já escrevemos uma série de 03 (três) artigos sobre os Direitos Fundamentais (clique nos links para ler): Os Direitos Fundamentais, em que discorremos sobre a definição e características, e fizemos uma pequena análise do catálogo constitucional; Os Direitos Fundamentais – II - em que tratamos sobre hipóteses de conflito entre 2 (dois) direitos fundamentais; e Os Direitos Fundamentais - III - em que apresentamos os direitos fundamentais em espécie.

Conforme exposto nos artigos, todos os direitos fundamentais – individuais, sociais, políticos, culturais, econômicos, ambientais – possuem a mesma escala de importância. Em havendo conflito entre dois ou mais direitos/ princípios, o julgador terá de adotar os critérios da ponderação, da razoabilidade e da proporcionalidade na análise da situação, para assim aplicar o melhor direito ao caso concreto.

No caso da vacina, nos parece evidente a aplicação da regra de Direito Administrativo que determina a supremacia do interesse público (assegurar o direito à vida, à saúde, à erradicação de doenças) sobre o privado (autodeterminação, disposição sobre o próprio corpo). Ou seja: o direito coletivo está acima do direito individual.

O fenômeno da polarização política extremada em nosso país nos últimos tempos certamente é o maior responsável pelo debate sobre a vacinação. O tema, que talvez fosse inquestionável há alguns anos, hoje causa controvérsias e discussões ferrenhas (e até mesmo irracionais) por parte da população que, com “fundamento” em incontáveis fake news veiculadas nas redes sociais, acreditam fielmente na possibilidade de que a vacina será capaz de alterar o DNA humano, ou de que será utilizada como meio para implantação de um chip para rastrear as pessoas. 

O radicalismo de alguns grupos, que dividem a sociedade de forma simplista - ou é AMIGO (aquele que pensa igual a mim) ou é INIMIGO (porque discorda de mim) -, gerou um antagonismo nunca antes visto, trazendo consigo uma onda de intolerância e intransigência para com o diferente que se mostra incapaz de um diálogo inteligente, em uma completa aniquilação do pensamento dissonante.

E isso vem ocorrendo desde o início da pandemia do coronavírus, quando parte da população passou a questionar a necessidade de utilização de máscaras e álcool em gel para a proteção individual, a adoção do distanciamento/ isolamento social visando conter a disseminação e contágio pelo vírus, o fechamento do comércio e escolas, entre outras medidas. Outro ponto que gerou bastante discórdia foi o uso (controverso) do kit covid, contendo hidroxicloroquina e ivermectina, distribuído gratuitamente em alguns Municípios brasileiros. A triste realidade é que foi politizada uma questão de saúde pública = a busca por SALVAR VIDAS, o que deveria ser preocupação de todos, independentemente das bandeiras de direita x esquerda, tendo sido criada uma disputa de ideologias que se mostra cega, irrelevante e estéril.

Importante lembrar que nenhuma vacina é lançada e distribuída no mercado sem que tenham sido feitas dezenas de testes por laboratórios com credibilidade e haja segurança científica em sua aplicação - especialmente no caso da covid-19, em que bilhões de pessoas no planeta esperam ser imunizadas. 

Que as paixões políticas sejam deixadas de lado e a racionalidade vença. Pelo bem de todos e pela erradicação deste vírus que já ceifou milhões de vidas.

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Dica de leitura sobre o assunto:

Vacinação obrigatória, liberdade e pandemia


quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Usucapião Urbana de Apartamento

Aqui no BLoG, já tratamos sobre Usucapião por Abandono do Lar, onde falamos um pouco sobre essa nova modalidade de aquisição originária da propriedade imóvel. A lei prevê ainda a especial rural ou agrária, ordinária, extraordinária, especial indígena e especial urbana coletiva). 

Sobre a urbana, o artigo 183 da Constituição Federal de 1988 assim prevê:


Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.


Há alguns meses, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade de usucapião urbana de apartamento. Isso porque a norma constitucional não distingue se o imóvel que menciona é unicamente individual ou se pode fazer parte de um unidade autônoma situada em condomínio edilício - refere apenas que deve ter até 250 metros quadrados e ser utilizada como moradia individual ou da família.

Transcrevemos trecho do voto do Relator do recurso, Ministro Marco Aurélio:

 

(...)

De acordo com o artigo 183, tem-se como própria à usucapião área urbana de até 250m2, utilizada para moradia individual ou da família. Cumpre compreender a razão do dispositivo, que outra não é senão, a partir da passagem do tempo, dos cinco anos, regularizar-se situação indispensável a ter-se a consolidação da moradia. A referência à área e à destinação do imóvel é conducente a apanhar o solo e a construção existente. Indispensável a usucapir é que, há cinco anos, o interessado venha utilizando o imóvel como moradia. Então, não possuindo outro imóvel urbano ou rural, adquire-lhe o domínio, vedada essa aquisição àqueles que anteriormente já usucapiram outro imóvel bem como no tocante aos imóveis públicos.

(...)

 O Estatuto da Cidade – Lei nº 10.257/2001 -, ao aludir, no artigo 9º, a usucapião, revela que este é possível, considerada a área ou edificação urbana de até 250m2, sem cogitar do afastamento de unidade condominial. Aqui surge norma harmônica com o artigo 183 da Lei Fundamental, no que também esta não distingue, ao cuidar do usucapião ante ocupação de área urbana de até 250m2, exigindo – e aí dá-se a necessidade de se contar com construção – que venha sendo utilizada como moradia individual ou da família.

Por último, note-se que o novíssimo Código Civil – Lei nº 10.406/2002 –, no artigo 1.240, dispõe sobre usucapião de área urbana, também sem qualquer restrição. De acordo com os artigos 1.331, § 3º, e 1.332, inciso II, a cada unidade imobiliária caberá uma fração ideal no solo e nas partes comuns, devendo tal fração constar do instrumento de instituição do condomínio. Requer-se, não sobra qualquer dúvida, que se tenha a individualização do apartamento que compõe a unidade e também a fração do terreno. Passam a unidade e a fração a formar um todo que se mostra merecedor da nomenclatura “propriedade”, sendo, portanto, passível de vir a ocorrer a transferência usucapião.

(...)


domingo, 13 de dezembro de 2020

AME - Uma Corrida Contra o Tempo

AME = Atrofia Muscular Espinhal. Doença muscular neurodegenerativa evolutiva e incapacitante de alta letalidade. Ausência ou defeito no gene que produz a SMN - proteína que protege os neurônios motores, responsáveis por levar o impulso nervoso da coluna vertebral para os músculos. Sem essa proteína, os neurônios morrem e os impulsos nervosos não chegam, o que provoca uma perda progressiva da função muscular e as consequentes atrofia e paralisação dos músculos, afetando a respiração, a deglutição, a fala e a capacidade de andar.

Existem 03 (três) tipos de AME, sendo que a tipo 1, forma mais grave da doença, atinge de 45% a 60% dos casos (que no Brasil giram em torno de 8 mil crianças). A expectativa de vida para estes bebês é de 02 (dois) anos.

Atualmente, o tratamento padrão no Brasil, incorporado pelo SUS (Sistema Único de Saúde) é a aplicação do medicamento SPINRAZA (do laboratório farmacêutico Biogen), consistente em 06 (seis) doses no primeiro ano de vida, e depois 01 (uma) dose a cada 04 (quatro) meses, pelo resto da vida. Além disso, há necessidade de manutenção, suporte ventilatório e possíveis internações hospitalares em UTI (unidade de terapia intensiva).

De outro lado, o tratamento de terapia gênica mais indicado é a aplicação do medicamento ZOLGENSMA (do laboratório farmacêutico Novartis), cuja aplicação é em dose única, sem necessidade de manutenção. Embora devidamente registrado perante a ANVISA desde agosto de 2020, o SUS ainda não disponibiliza essa medicação, cujo custo é de $ 2.125 milhões (aproximadamente R$ 12 milhões). 

O alto custo do ZOLGENSMA (valor proibitivo mesmo nos países ricos) se dá em razão de ser "medicamento órfão" - ou seja, destinado a apenas um pequeno número de doentes, razão pela qual a indústria farmacêutica tem pouco interesse em desenvolver e comercializar esse tipo de remédio (diante dos elevados custos para sua inserção no mercado x valor recebido pelas vendas). Ele atua corrigindo o defeito na base, ou seja, fornece uma cópia funcional do gene SMN humano para deter a progressão da doença através da expressão continuada da referida proteína. Em outras palavras: o ZOLGENSMA insere o material genético modificado no organismo da criança. 

Já tratamos aqui no ::BLoG:: acerca da Concessão de Medicamentos fora da Lista do SUS (clique no link). Para que o Poder Público (União, Estados e Municípios) forneça medicamentos que não constam na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), mostra-se necessário/ obrigatório o preenchimento dos seguintes requisitos:

1) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;

2) Incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do medicamento prescrito;

3) Existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Temos acompanhado de perto o caso dos dois gauchinhos que estão em uma corrida contra o tempo em busca do ZOLGENSMA: Enzo Gabriel Nunes Jung (de Novo Hamburgo) e João Emanuel Rasch Schropfer (de Lindolfo Collor), os quais completam 2 (dois) anos em março e julho/2021, respectivamente.

Quando do ajuizamento das demandas perante o Poder Judiciário, além do laudo médico e comprovação de insuficiência de recursos para adquirir o remédio, tem sido exigida uma imposição extra: a demonstração, pela família, de que parte do valor necessário para a aquisição do ZOLGENSMA já foi angariada, de modo a que, em última análise, o Estado apenas complemente a quantia buscada. 

Ambos os bebês já arrecadaram parte do montante através de ações sociais, rifas, vendas de produtos, lives musicais, sorteios, doações, em uma corrente de solidariedade incrível. Seguem os links de acessos dos perfis dos gauchinhos no Instagram e os dados bancários para depósitos de valores. 

IMPORTANTE: Na semana que passou, foi veiculado na mídia que a CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) autorizou a redução do valor do ZOLGENSMA para cerca de R$ 3 milhões. Todavia, não se trata de decisão oficial e definitiva, uma vez que a farmacêutica Novartis já apresentou recurso contra o preço estabelecido para comercialização. Assim, as crianças portadoras de AME Tipo 1 seguem necessitando angariar os R$ 12 milhões para seu tratamento.

💗💗 AME HOJE, AME AGORA, AME SEMPRE! 💗💗


AME O ENZO - Instagram



AME JOÃO EMANUEL - Instagram



domingo, 6 de dezembro de 2020

Controle das Idas ao Toalete pelo Empregador

Tema (ainda!) recorrente na Justiça do Trabalho diz respeito ao controle/ proibição, pelo empregador, das idas ao toalete de seus funcionários. Em pleno 2020, ainda temos decisões judiciais que necessitam reconhecer a óbvia lesão aos direitos da personalidade dos empregados que têm sua intimidade e dignidade atingidas pela prática abusiva de suas chefias.

Conforme entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, por dizer respeito à satisfação de necessidades fisiológicas, a restrição ao uso de banheiros por parte do empregador configura dano à integridade do funcionário apto a ensejar indenização por dano moral. Como exemplo, podemos citar a obrigatoriedade de  pedir licença ao empregador; justificar a ida ao banheiro; e a absurda imposição de marcação, no cartão ponto, do tempo de permanência no toalete.

Recentemente, o TST julgou recurso em demanda que assim versava:

"Na inicial, postulou a reclamante o pagamento de indenização por danos morais, ao argumento de que foi submetida a situação extremamente constrangedora e prejudicial a sua saúde. Descreveu que a empresa acionada limitava as idas ao banheiro, bem como o tempo de permanência, sendo de no máximo 5 (cinco) minutos, ignorando completamente a NR-17, que em seu item 5.7 permite a saída dos empregados de seus postos de trabalho a qualquer momento da jornada para satisfazer suas necessidades fisiológicas. 

Acrescentou que o controle era feito pelo sistema de informática da reclamada, de modo que, ao se ausentar do seu posto, era necessário apertar a tecla "pausa banheiro"; após, o sistema automaticamente enviava uma mensagem para o supervisor, registrando o nome da pessoa e a contagem do tempo. Caso ultrapassado os 5 (cinco) minutos apareceria no monitor uma mensagem de alerta com a informação "pausa estourada", destacada em vermelho. 

Diante da postura opressiva da empregadora, a reclamante alegou que acabava por evitar ao máximo fazer uso do banheiro, acarretando-lhe danos a sua higidez física e emocional." (grifos nossos)


Outro elucidativo acórdão do TST assim restou ementado:


RECURSO DE REVISTA. COMISSÕES. AJUSTE. AUSÊNCIA DE PROVA. O egrégio Tribunal Regional concluiu pela inexistência de prova do ajuste para o pagamento de comissões. Registrou tratar-se de mera possibilidade de implementação de comissionamento por vendas, que teria partido de pessoas que não detinham legitimidade para fixar a remuneração da reclamante, considerando o porte e a estrutura da reclamada. Recurso de Revista não conhecido neste ponto . DANO MORAL. RESTRIÇÃO AO USO DO SANITÁRIO . Restringir o uso de toaletes por meio de autorização prévia expõe indevidamente a privacidade do trabalhador, ofendendo sua dignidade sem qualquer razoabilidade, posto que não se pode objetivamente controlar de forma genérica a periodicidade da satisfação de necessidades fisiológicas que se apresentam em níveis diferentes em cada indivíduo. Tal proceder revela extrapolação aos limites do poder diretivo do empregador, ocasionando constrangimento a sua intimidade e uma inaceitável sustentação de interesses negociais com o sacrifício e humilhação do empregado, como se nota na apontada medição da ANATEL, como argumento para a não utilização dos toaletes. As assunções dos riscos do negócio pelo empregador apenas a ele atingem. Recurso de Revista conhecido neste tópico. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. INEXISTÊNCIA DE MORA. A egrégia Corte Regional registra que o pagamento das verbas rescisórias se deu dentro do prazo de 10 (dez) dias fixado no artigo 477, § 6º, b, da CLT. Nesse contexto, inexistente violação do dispositivo em comento. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido" (RR-109400-43.2007.5.18.0012, 3ª Turma, Relator Ministro Horacio Raymundo de Senna Pires, DEJT 10/09/2010). (grifo nosso)


Logo, mostra-se inequivocamente abusivo e arbitrário todo e qualquer procedimento  por parte do empregador que denote fiscalização, controle ou punição de seu funcionário em razão das imprescindíveis idas ao banheiro, uma vez que privá-lo de satisfazer suas necessidades fisiológicas pode causar danos não somente à saúde física como também emocional do obreiro, tendo em vista a situação vexatória, constrangedora e humilhante a que é injustificadamente exposto. 

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

DJ e Casa Noturna = Vínculo de Emprego

Recentemente, o Tribunal Regional do Trabalho, através de sua 4.ª Turma, reconheceu a existência de vínculo empregatício entre uma casa noturna e o DJ residente (fixo) do estabelecimento. Conforme prova produzida nos autos do processo, estavam presentes todos os requisitos aptos a caracterizar a relação de emprego -  pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade -, nos termos dos artigos 2.º e 3.º da CLT:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Transcrevemos elucidativo trecho da decisão proferida pelo TRT-4:

"A prestação de serviços de DJ do reclamante era pessoal, o que também se presume dos depoimentos das testemunhas convidadas pela ré: ao confirmarem que o autor laborava de forma fixa na casa noturna. Ainda, a onerosidade da relação é incontroversa.

Além disso, referidas testemunhas nada mencionam acerca da autonomia do reclamante na prestação dos serviços. Pelo contrário, ambas referem o horário cumprido pelo autor, inclusive quanto ao intervalo intrajornada. Assim, presume-se a existência de subordinação face à ausência de prova em contrário.

Outrossim, a subordinação, como entendida atualmente pela doutrina, é definida pelo seu aspecto objetivo, ou seja, pela participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade do credor do trabalho. No caso, os serviços prestados pelo reclamante à reclamada - na função de DJ (disck jockey), selecionando músicas para serem tocadas para o público que frequentava a discoteca - se relacionavam à atividade-fim da empresa ré. Isso se extrai do próprio estatuto social da demandada, que inclui no seu objeto social, dentre outras atividades, a exploração de atividades de "bar, restaurante, boate e locação de espaços para exposições de placas e paineis publicitários" (letra 'h' da cláusula 3 do Id. b9255ea - Pág. 3). Além disso, a própria reclamada admite no recurso que o autor laborou de forma fixa no local, e não esporadicamente, como visto acima. Assim, havia a necessidade permanente do trabalho do reclamante, o que também se comprova pelo lapso temporal da relação havida entre as partes (mais de 6 anos). Verifica-se, portanto, a presença do elemento subordinação, em sua forma estrutural."

Importantes aspectos a serem salientados dizem respeito à irrelevância da prestação de serviços (com carteira assinada) pelo Reclamante para empresa diversa no mesmo período - uma vez que a relação de emprego não exige exclusividade -, bem como o fato de que a realização de outras atividades laborais pelo Obreiro para a Reclamada (como técnico de som) não descaracteriza o vínculo empregatício como DJ, eis que os serviços de sonorização se deram apenas de forma complementar.

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Leia também:

Integrante de Banda e Vínculo de Emprego Reconhecido


sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Locação Comercial x Bem de Família do Fiador

Matéria já consolidada no Supremo Tribunal Federal diz respeito à constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação - vide decisão proferida em sede de repercussão geral representada pelo Tema 295 da Corte.

TODAVIA, referida tese não se aplica ao contrato de locação de imóvel comercial, nos termos da recente decisão de relatoria da Ministra Cármen Lúcia nos autos do Recurso Extraordinário n.º 1.278.427/SP, traduzida na seguinte ementa:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À MORADIA. BEM DE FAMÍLIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL COMERCIAL. FIADOR. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. 

Em antigo anterior do BLoG - Nos Contratos, não confunda Fiador com Testemunha -, aduzimos que "outra particularidade do contrato de fiança diz respeito à impossibilidade de se alegar a impenhorabilidade do bem de família quando da execução. Vale dizer: o único imóvel que serve de residência ao efetivo devedor/ inadimplente não pode ser objeto de penhora, mas o do fiador que espontaneamente assume a obrigação sim."

Entretanto, no caso do contrato de locação de imóvel comercial, prevalecem o princípio da isonomia, o direito social à moradia e a observância do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição Federal.

Há de se ressaltar o importante precedente referido no acórdão, cujo aresto segue:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO MANEJADO CONTRA ACÓRDÃO PUBLICADO EM 31.8.2005. INSUBMISSÃO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. PREMISSAS DISTINTAS DAS VERIFICADAS EM PRECEDENTES DESTA SUPREMA CORTE, QUE ABORDARAM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA EM LOCAÇÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO QUE ENVOLVE DÍVIDA DECORRENTE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL COMERCIAL. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. INCOMPATIBILIDADE COM O DIREITO À MORADIA E COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA. 1. A dignidade da pessoa humana e a proteção à família exigem que se ponham ao abrigo da constrição e da alienação forçada determinados bens. É o que ocorre com o bem de família do fiador, destinado à sua moradia, cujo sacrifício não pode ser exigido a pretexto de satisfazer o crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa. Interpretação do art. 3º, VII, da Lei n. 8.009/1990 não recepcionada pela EC n 26/2000. 2. A restrição do direito à moradia do fiador em contrato de locação comercial tampouco se justifica à luz do princípio da isonomia. Eventual bem de família de propriedade do locatário não se sujeitará à constrição e alienação forçada, para o fim de satisfazer valores devidos ao locador. Não se vislumbra justificativa para que o devedor principal, afiançado, goze de situação mais benéfica do que a conferida ao fiador, sobretudo porque tal disparidade de tratamento, ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito à moradia. 3. Premissas fáticas distintivas impedem a submissão do caso concreto, que envolve contrato de locação comercial, às mesmas balizas que orientaram a decisão proferida, por esta Suprema Corte, ao exame do tema n. 295 da repercussão geral, restrita aquela à análise da constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido” (STF, 1.ª Turma, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n.º 605.709, redatora Ministra Rosa Weber, DJe 18.2.2019). (grifos nossos).


domingo, 18 de outubro de 2020

Doenças Psiquiátricas e Benefícios Previdenciários

Em decorrência do afastamento/ isolamento social ocasionados pela pandemia do Covid-19, aumentaram (e muito) os casos de depressão entre os brasileiros a partir do mês de março deste ano. No mesmo sentido, houve acréscimo nos casos de ansiedade, estresse agudos e abuso de substâncias - tema este que tratamos anteriormente no artigo sobre o Setembro Amarelo em Tempos de Quarentena .

É de salientar que há estudiosos que consideram a saúde mental, em tempos de coronavírus, como uma espécie de pandemia oculta, face aos transtornos psicológicos ocasionados em larga escala (aumento no número e gravidade das situações) - inclusive, o prognóstico é de que uma crise de proporções globais se aproxima.

Importante lembrar que as patologias mentais/ comportamentais podem ocasionar a incapacidade para o trabalho, gerando o direito a requerer benefícios previdenciários junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (desde que preenchidos os pressupostos legais). São eles:

  • Auxílio-Doença =
Incapacidade temporária para o trabalho ou atividade habitual (comprovada em perícia médica) por período superior a 15 (quinze) dias, decorrente de doença ou acidente, sendo necessária a qualidade de segurado perante o INSS e carência de 12 (doze) meses de contribuição - exceto as doenças que excluem essa exigência (como é o caso da alienação mental), constantes da PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 2.998/2001 .

  • Aposentadoria por Invalidez =
Incapacidade total e permanente para o exercício de qualquer atividade laborativa, e insuscetível de reabilitação em outra profissão (comprovada em perícia médica), qualidade de segurado perante o INSS e carência de 12 (doze) meses de contribuição - exceto as doenças que excluem essa exigência (como é o caso da alienação mental), constantes da PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 2.998/2001 .
  • Benefício Assistencial (LOAS) =

Para pessoas com deficiência, ou seja, que apresentam impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que obstruam sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais. Para receber um salário mínimo mensal, é necessário comprovar que não possui meios de prover a própria subsistência (tampouco sua família possa - renda per capita familiar inferior a 1/4 do salário mínimo nacional).


O requerimento de tais benefícios pode ser dar através do aplicativo Meu INSS, pelo INSS Digital ou ainda pelo telefone 135. Caso o pedido seja negado administrativamente, é possível o ajuizamento de ação perante a Justiça Federal.

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Saiba mais sobre os benefícios previdenciários no site do INSS:

https://www.inss.gov.br/beneficios/


quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Bloqueio e Exclusão de Perfis nas Redes Sociais

Nos tempos atuais, de grande interação virtual (exponencialmente aumentada pelo distanciamento social que a pandemia do covid-19 impôs a todo planeta), considerável parte da população mantém perfis pessoais nas redes sociais disponíveis, com o intuito de compartilhar pensamentos, fotos e vídeos.  

Questão recente que vem sendo levada à apreciação do Poder Judiciário diz respeito à possibilidade (ou não) dos proprietários do Facebook, Instagram Twitter e Snapchat (para mencionar os mais conhecidos) realizarem o bloqueio (desativação) ou exclusão sumária de perfis, sem que seja observado o direito à defesa da parte prejudicada.

Se de um lado temos as prerrogativas das proprietárias das plataformas de verificarem se os perfis pessoais estão em consonância com os termos e políticas de uso da rede social, do outro temos as garantias fundamentais constitucionais dos usuários, consistentes na ampla defesa, contraditório e devido processo legal, previstos no artigo 5.º, inciso LV, da CF/88.

Há de se fazer uma distinção: enquanto o bloqueio se dá por determinado período de tempo (que pode ser de 3 ou 30 dias, a depender de eventual reincidência), mantendo-se hígido o perfil, a exclusão  literalmente apaga todo o conteúdo da página, ou seja, publicações de textos e/ou imagens e rede de contatos.

Importante dizer que aplica-se ao caso o disposto no artigo 422 do Código Civil, o qual determina que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Da mesma forma, devem ser observados os deveres anexos de informação, zelo, confiança, lealdade, transparência, colaboração, segurança.

Assim, ao contrário da explicação apresentada por algumas plataformas para justificar o ato, a desativação/ cancelamento dos perfis não se trata de mero exercício regular de um direito. Mostra-se necessária a demonstração da violação praticada/ ilícito cometido, bem como apresentação de motivação válida, sob pena de configuração de ilegalidade/ arbitrariedade do ato.

Vivemos em uma democracia, onde a liberdade de expressão e a livre manifestação de pensamento são direitos previstos e assegurados pela Carta Magna. A supressão do direito à comunicação através das redes sociais, privando o usuário das interações online, configura censura, prática contrária aos ditames constitucionais vigentes.

Sempre bom lembrar que os crimes praticados no Admirável Mundo Virtual também são passíveis de punição, podendo o ofensor responder pelo ilícito no Implacável Mundo Real: promover o discurso de ódio, a incitação à violência, à prática de bullying e incentivo à pornografia (para citar alguns conteúdos impróprios).

Dessa forma, temos que tanto o bloqueio quanto a exclusão indevida/ injustificada de perfil nas redes sociais acarreta constrangimentos perante os familiares, amigos e contatos (pessoais e profissionais) do prejudicado. Logo, a afronta aos direitos de personalidade - em especial à dignidade da pessoa humana, face aos sentimentos de angústia, impotência, apreensão e intranquilidade perante o ofensor - é passível de indenização por dano moral.


quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Setembro Amarelo em Tempos de Quarentena

Estamos no mês tradicionalmente dedicado à campanha Setembro Amarelo. Oficialmente, hoje, 10/09, é  considerado o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio.

Neste ano de 2020, esse assunto tomou proporções ainda maiores. Em razão do necessário distanciamento social ocasionado pela pandemia do Covid-19, aumentou o número de pessoas que passaram a buscar atendimento na área da saúde mental.

Para além da redução/ ausência de contato pessoal com outros indivíduos (há quem praticamente se isolou em março e ainda não retornou à vida em sociedade), o fato é que vimos nossas rotinas sendo drasticamente mudadas em questão de dias. O uso regular de máscaras e necessidade constante de higienizar as mãos com álcool em gel, por exemplo, passaram a fazer parte de um novo "normal" ao qual é difícil se adaptar.

Já faz 06 (seis) meses que os dias passam lenta e repetidamente, e não se vislumbra o fim da quarentena que a vida nos impôs nesse momento... por outro lado, o medo do contágio e o cuidado intenso/obsessivo com a saúde, a angústia pelo desemprego/ redução do salário, o estresse/ cansaço ocasionado pelas aulas e reuniões online e a saudade de beijar e abraçar familiares e amigos aumentaram de forma acelerada. 

Conforme informação disponibilizada no site Setembro Amarelo (clique no link para acessar), são registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de 01 milhão no mundo. Trata-se de uma triste realidade, que registra cada vez mais casos, principalmente entre os jovens. Cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias.

A Caixa de Assistência dos Advogados do Rio Grande do Sul (CAA/RS) tem promovido atividades especiais por meio da campanha "Não coloque sua saúde mental em quarentena", visando o bem-estar mental/ emocional da advocacia gaúcha. Já o Programa PREVINE SAÚDE MENTAL possibilita a contratação de serviço de atendimento psicológico online - Setembro Amarelo l CAA/RS.

Em razão do estigma e preconceito que ainda existe, muitas pessoas que possuem alguma condição mental sofrem em silêncio, por medo de serem rotuladas pelo julgamento alheio, e assim não buscam o tratamento especializado adequado (com psicólogos ou psiquiatras), negligenciando sua saúde e bem-estar. 

Que não apenas em setembro, nem somente durante esse período de pandemia, possamos praticar a empatia, a solidariedade e a escuta ativa (demonstrar interesse na fala do outro). Que consigamos ter um olhar amoroso e compreensivo para o próximo, e oferecer apoio a quem está passando por um momento difícil da vida, em que há desequilíbrio na saúde em suas dimensões física/ mental/ emocional e espiritual.

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CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, email e chat 24 horas todos os dias.


sábado, 29 de agosto de 2020

Cobrança de Multa por Fidelização

Atualmente, nos contratos de telefonia, internet e tevê por assinatura, tem sido praxe constar cláusula de fidelização do cliente, a qual estipula multa em caso de rescisão do avençado antes do prazo de permanência mínima - em regra, 12 (doze) meses. 

Questão que vem sendo debatida diz respeito à legalidade de tal cobrança, por tratar-se de verdadeira "amarra" imposta pelo fornecedor ao consumidor durante determinado lapso de tempo, obrigando-o a permanecer com o serviço.

Ocorre que o entendimento dos órgãos de proteção ao consumidor e dos tribunais pátrios é no sentido de que é sim possível estabelecer multa rescisória em caso de rompimento do contrato antes do prazo predeterminado, a qual deverá ser calculada de modo proporcional ao tempo faltante. 

A fidelidade aqui é entendida da seguinte forma: para operacionalizar a prestação dos serviços, é necessário que a empresa fornecedora se desloque até a residência do cliente e instale todo o equipamento necessário para viabilizar o uso de telefonia, internet e tevê por assinatura - o que demanda um custo (investimento) inicial. Ademais, a cláusula de fidelização, ao assegurar a prestação do serviço por um período mínimo de tempo, permite ao fornecedor dar desconto no valor total, que vai diluído nas mensalidades. 

Por este motivo, em sendo rompida a relação consumerista antes do prazo previsto, é possibilitado ao fornecedor a cobrança de multa referente ao período faltante. Como exemplo: se o contrato assinado é de 12 meses e o consumidor rescinde após 60 dias, a operadora poderá exigir o pagamento de penalidade, a incidir sobre os 10 meses restantes - ou seja, referente a 10/12 avos.

Quando é possível o cancelamento do serviço sem o pagamento de multa?

- quando o consumidor não recebeu os benefícios contratados;

- quando o serviço não é ofertado a contento;

- quando a cláusula de fidelização/ multa não consta textualmente do contrato;

- quando não há menção expressa acerca do prazo ou este é superior a 12 (doze) meses.

 Em caso de ausência de previsão contratual ou redação não específica sobre o prazo, basta a juntada do documento assinado para demonstrar o direito. Em não sendo disponibilizados os benefícios conforme contratados, ou se o serviço se mostra falho/ de má qualidade (exemplo: internet banda larga em velocidade menor do que a prevista), é necessário que o consumidor comprove suas alegações - o que pode se dar através dos protocolos de reclamação à operadora. Ainda, o consumidor é desobrigado do pagamento da multa quando ele se muda e o novo endereço fica em área que não possui cobertura do serviço contratado.

Disso, temos que, em regra, o consumidor é obrigado a pagar multa de fidelidade em caso de rompimento do contrato antes do prazo previsto - sendo que o percentual 10% (dez por cento) sobre o tempo faltante do contrato é considerado adequado pelos órgãos de proteção ao consumidor, sob pena de configurar cláusula abusiva (o que o CDC veda expressamente). Porém, em havendo descumprimento das regras por parte das empresas de telefonia, internet ou tevê por assinatura, é possível afastar a obrigatoriedade do adimplemento da penalidade. 


quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Cães e Gatos, Sujeitos de Direito

Tese inovadora que vem causando polêmica no Judiciário gaúcho diz respeito à possibilidade de cães e gatos constarem como parte no pólo ativo de demandas que versem acerca de seus direitos. 

Nesta semana, em ação de destituição de tutela ajuizada por associação de proteção aos animais com sede em Porto Alegre, "em conjunto" com 2 cachorros e 8 gatos, vítimas de maus tratos por sua até então tutora (viviam acorrentados, em péssimas condições de bem-estar, sanitárias e ambientais),  foi proferida decisão que extinguiu o feito, sem julgamento de mérito, em relação aos animais, por ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. (art. 485, inciso IV do NCPC).

Invocando o Código Estadual do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul (Lei Estadual  n.º 15.434/2020) como base legal, o advogado que representou os autores aduziu que, nos termos da legislação em comento, os animais de estimação domésticos são sujeitos de direito despersonificados, não podendo ser tratados como coisa - inclusive, foram devidamente identificados com nome e sobrenome na inicial.

Fulcro na Constituição Federal de 1988, em especial o seu artigo 22, inciso I, que determina caber à União - e não aos Estados - legislar sobre Direito Processual, a Magistrada entendeu que, embora o Código Estadual do RS estabeleça a natureza sui generis dos animais, não prevê a capacidade processual dos mesmos, e tampouco poderia, sob pena de declaração de inconstitucionalidade, face a matéria.

Por outro lado, a Juíza ressaltou em sua decisão que, embora os "não humanos" não possam ser parte no processo, isso não retira seus direitos à efetiva proteção, a qual consta expressamente no texto da Carta Magna - artigo 225, § 1.º, inciso VII, além dos artigos 216 e 217 da Lei Estadual n.º 15.434/2020.

No início deste mês, outro caso envolvendo animal de estimação foi amplamente noticiado no Estado: um dos autores da ação se trata de um pet da raça shitzu. Em litisconsórcio ativo com seus tutores, o cão ajuizou ação de indenização por danos materiais, morais, físicos e psíquicos contra uma pet shop. Conforme narrado na petição inicial, o animal foi submetido a danos físicos e psicológicos decorrentes do mau atendimento prestado pelo estabelecimento, uma vez que, na sessão de banho, sofreu uma fratura no maxilar e necessitou de cirurgia.

Tendo sido determinada a exclusão do animal de estimação do feito, foi interposto recurso de agravo de instrumento, o qual foi recebido em seu efeito suspensivo, bem como foi ordenada a suspensão do processo na origem (Porto Alegre), até a deliberação do Colegiado. Nas palavras do relator, Desembargador Carlos Eduardo Richinitti, da 9.ª Câmara Cível do TJRS:

Já no que diz com a exclusão do cão Boss do polo ativo da lide, a matéria é deveras inédita neste Órgão Julgador e, até onde se tem conhecimento, no Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul. Os argumentos trazidos pelos agravantes, de igual sorte, são novos no cenário jurídico nacional, havendo invocação de legislação estadual recentemente vigente (Lei Estadual n° 15.434/2020), além de questões envolvendo conflito de normas e de direito internacional que requerem uma análise meticulosa por este Colegiado. Ainda que simpático à efetiva proteção dos animais, sejam eles de estimação, domésticos ou selvagens, não posso descuidar da importância que um precedente como este possui e das delicadas questões que o envolvem, notoriamente no âmbito processual e de defesa dos animais.

De outro lado, o risco de dano reside na possibilidade de o feito ser extinto na origem pela falta de recolhimento das custas de distribuição, cerceando os autores do acesso à Justiça e, caso recolhidas as custas, na continuidade da tramitação do processo sem um litisconsorte - o cão Boss -, o que inclusive poderia trazer prejuízo a eventual defesa apresentada pela parte contrária se o presente recurso vier a ser provido por este Colegiado.

Desta forma, sem que isso representa vinculação à tese autoral, tenho que prudente, por ora, receber o presente recurso em seu efeito suspensivo, determinando a suspensão do processo na origem, a fim de que se escute previamente o Ministério Público e possa se manifestar o Colegiado a respeito das questões postas neste recurso.   

Aguardemos o pronunciamento do TJRS sobre o eventual reconhecimento da legitimidade ativa canina e felina, o que poderá vir a ser uma decisão pioneira e inovadora no Judiciário brasileiro, apta a alterar os rumos do Direito Animal.

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BASE LEGAL -

Constituição Federal de 1988  

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
(...)
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. 


Lei Estadual  n.º 15.434/2020

Art. 216 - É instituído regime jurídico especial para os animais domésticos de estimação e reconhecida a sua natureza biológica e emocional como seres sencientes, capazes de sentir sensações e sentimentos de forma consciente.
Parágrafo único - Os animais domésticos de estimação, que não sejam utilizados em atividades agropecuárias e de manifestações culturais reconhecidas em lei como patrimônio cultural do Estado, possuem natureza jurídica "sui generis" e são sujeitos de direitos despersonificados, devendo gozar e obter tutela jurisdicional em caso de violação, vedado o seu tratamento como coisa.

Art. 217 - São proibidos o extermínio, os maus tratos, a mutilação e a manutenção de animais domésticos de estimação em cativeiros ou semicativeiro que se encontrem em condições degradantes, insalubres ou inóspitas, sob pena das sanções previstas nos arts. 92 e 93 desta Lei.
Parágrafo único - Incorre nas mesmas sanções a que se refere o "caput" deste artigo quem abandona animais domésticos de estimação em via ou praça pública, com intenção de pôr fim a sua guarda.


terça-feira, 25 de agosto de 2020

Responsabilidade Civil dos "Digital Influencers"

Canal no Youtube. Perfil no Facebook, Twitter ou Instagram. Curtidas de Amigos, Likes de Followers. De anônimos a estrelas. Números crescentes. Exponenciais. Escalas que vão de mil a milhões. De repente, webcelebridades.

Nesse terreno fértil da vida online nasceram os influencers, ou melhor, digital influencers. Pessoas que, seja em razão de seu talento, beleza, opiniões polêmicas ou comentários inteligentes, acabam arrebatando um séquito de fãs na Internet. 

Os mais "famosos", leia-se, com maior número de seguidores nas redes sociais, acabam sendo elevados à categoria de formadores de opinião, e com isso atraindo o patrocínio/ parceria de grandes empresas no mercado. Ao fazer publicidade de produtos e serviços diante de seus followers - seja através de posts, vídeos ou stories, os influencers se tornam a cara daquela marca. Vendem. São remunerados. 

Recentemente uma Juíza no Rio de Janeiro, por ocasião do julgamento de demanda consumerista, imputou a uma digital influencer a responsabilidade civil OBJETIVA por ter indicado a compra de um produto (iPhone) vendido por determinada loja que não entregou o smartphone, pois estava aplicando golpes Brasil afora. 

Além de incentivar a compra, a famosa também assegurava a qualidade e segurança na aquisição do produto. Assim, entendeu a Magistrada que a influencer das mídias sociais deveria ressarcir a consumidora enganada pelo estabelecimento cujo nome promovia, indenizando os danos materiais suportados (valor do iPhone). Já os danos morais não restaram reconhecidos.

Embora inexistisse relação de consumo, se aplicaria ao caso o comando constante do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil de 2002, a saber:

Art. 927. (...)

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Uma vez que a digital influencer exerce atividade habitual de venda/ exposição de produtos na internet, pelo que aufere lucros, e a cuja(s) marca(s) associa a sua imagem e credibilidade, deve responder por eventuais danos ocasionados à consumidora que, no caso em comento, ficou sabendo da promoção no perfil de rede social da famosa.

Será um caso isolado de responsabilização objetiva pela publicidade realizada ou o futuro dos influencers será o de responder pelos produtos e serviços que promoverem? O papel das webcelebridades é de unicamente ditar comportamentos e inspirar estilos de vida, ou sua influência vai mais além e pode causar danos aos seus seguidores? Trata-se de mero criador de conteúdo virtual ou empreendedor digital por excelência? Só o tempo (e os likes) dirão.  


terça-feira, 18 de agosto de 2020

Práticas Integrativas e Complementares no SUS

Para assegurar uma boa qualidade de vida, há de se buscar um equilíbrio da saúde em suas quatro dimensões: física, mental, emocional e espiritual.

Para além da já conhecida Medicina convencional, existem procedimentos denominados Práticas Integrativas e Complementares, recursos terapêuticos baseados em conhecimentos tradicionais que buscam promover a prevenção de doenças.

Cronologicamente falando, em 2006 foi implementada no Brasil a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), quando passaram a ser oferecidas 05 (cinco) atividades. Em 2017, mais 14 (quatorze) procedimentos foram incorporados e, já no ano de 2018, o Sistema Único de Saúde (SUS) passou a contar com 29 (vinte e nove) práticas disponíveis à população, grande parte delas já na Atenção Básica dos Municípios (a depender das políticas públicas implementadas). São elas:



Os procedimentos mais utilizados em nosso país são a Acupuntura, Medicina Tradicional Chinesa, Auriculoterapia, Yoga e Dança Circular/ Biodança.

Importante dizer que há evidências científicas que demonstram os benefícios dos mencionados recursos terapêuticos, através de um tratamento integrado entre a medicina convencional e as referidas práticas complementares (medicina alternativa). 

Ademais, é crescente o acesso dos usuários do SUS a estes procedimentos (alguns deles milenares), bem como do número de profissionais qualificados e habilitados que atuam nas áreas supracitadas, que representam uma nova cultura do CUIDADO.

Mais do que tratar os enfermos, é preciso investir na prevenção das doenças. Mais do que fornecer a cura, é necessário priorizar o não adoecimento das pessoas. PROMOVER SAÚDE INTEGRAL = BEM ESTAR E HARMONIA FÍSICA, MENTAL, EMOCIONAL E ESPIRITUAL.



Saiba mais sobre as PICS em ::PORTAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE::



sábado, 8 de agosto de 2020

Renegociação de Contratos na Pandemia

Com a chegada da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) ao Brasil, escrevemos artigo aqui no BLoG denominado Obrigação Contratual, Pandemia e Responsabilidade Civil (clique no link para ler), o qual finalizamos dizendo que

O momento extraordinário e anômalo que estamos vivendo demanda serenidade e cautela e, mais do que nunca, cabe a nós, advogados, incentivar a utilização dos métodos alternativos de resolução de conflitos (como a conciliação e a mediação), regidos pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, visando a breve composição dos litígios que possam advir, de forma também a não sobrecarregar ainda mais o Poder Judiciário.

Passados quase 05 (cinco) meses desde então, seguimos acreditando que a melhor alternativa para os desacordos instaurados em razão da pandemia segue sendo a resolução extrajudicial e amigável dos conflitos. Isso porque

O princípio da boa-fé, dada a sua grande importância, foi alçado ao status de artigo de lei, e deve ser utilizado para interpretar, integrar ou corrigir cláusulas contratuais.

Neste momento, assim como o princípio da função social, mostram-se fundamentais para se buscar a melhor solução para as partes envolvidas. Há de se garantir o equilíbrio contratual - o que também envolve as perdas, manter o diálogo franco e aberto visando a compreensão/ cooperação, restaurar a reciprocidade através da negociação, devendo as informações acerca da real situação das partes contratantes serem comunicadas com transparência e verdade.

Neste sentido, em evento virtual promovido pela OAB Nacional nesta semana - I Congresso Digital Covid-19 Repercussões Jurídicas e Sociais da Pandemiao Ministro Luís Felipe Salomão, do STJ, aduziu que a melhor alternativa para as empresas que se encontram em dificuldade econômica e financeira é a prévia renegociação de seus contratos, o que inclusive considera um dever das partes. Isso porque, diante do panorama atual que indica uma enxurrada de demandas judiciais a seguir, sairá ganhando quem conseguir resolver suas contendas nas vias administrativas, sem precisar recorrer ao Poder Judiciário.  

Embora os conceitos de caso fortuito e força maior estejam sendo bastante invocados com a finalidade de romper contratos estabelecidos, na visão do Ministro é preciso analisar, no caso concreto, quem realmente não possui condições de cumprir o pactuado e quem está utilizando a pandemia como mera desculpa para não fazê-lo. Em suas palavras, "é preciso separar o joio do trigo, separar aquele que quer se aproveitar do momento daquele que está agindo de boa-fé".

Leia também: As Relações de Direito Privado na Pandemia


domingo, 26 de julho de 2020

30 anos - Código de Defesa do Consumidor


Assim como o Estatuto da Criança e do Adolescente, também o Código de Defesa do Consumidor completará 30 anos de existência em 2020. Datado de 11 de setembro de 1990, o CDC ingressou no ordenamento jurídico pátrio visando proteger a "pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final", a qual poderá ser considerada parte hipossuficiente e vulnerável no mercado de consumo - perante o fornecedor.

Um do princípios mais importantes da Política Nacional das Relações de Consumo é o da "harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores."

Anteriormente, aqui no BLoG, já escrevemos sobre Inscrição de Dívidas no SPC/SerasaVisibilidade dos Preços dos Produtos e Serviços aos ConsumidoresSites de Compras Coletivas, Cadastros Restritivos de Crédito e Responsabilidade do CredorConsumo no Verão e Direito à InformaçãoCDC e a Cobrança Indevida de Tarifas nas Faturas do Cartão de Crédito (clique nos links para ler).

No artigo 6.º da Lei n.º 8.078/90, encontramos os direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
IX - (Vetado);
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Já o artigo 39 trata expressamente das práticas consideradas abusivas e vedadas ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre os quais citamos:

a) condicionar o fornecimento de produto/ serviço ao fornecimento de outro produto/ serviço = constitui venda casada; b) enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço = equivale a amostra grátis;
c) prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor (em razão da idade, saúde, condição social ou grau de instrução) para lhe pressionar/coagir a adquirir produto ou serviço; d) exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
e) executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor; f) elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços;
g) permitir o ingresso em estabelecimentos comerciais ou de serviços de um número maior de consumidores que o fixado pela autoridade administrativa como máximo.                

terça-feira, 14 de julho de 2020

Estatuto da Criança e do Adolescente - 30 Anos

Em 13 de julho, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 30 anos de existência. A Lei n.º 8.069/90 tem por objetivo a proteção integral da criança (considerada a pessoa de até 12 anos incompletos) e do adolescente (que tem entre 12 e 18 anos de idade - excepcionalmente, a norma se aplica aos que têm entre 18 e  21).

Conforme dispõem os artigos 3.º e 4.º da lei:

Art. 3.º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Parágrafo único.  Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.

Art. 4.º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Cabe a todos zelar pelo direito à liberdade, ao respeito e à dignidade das crianças e adolescentes, pessoas em processo de desenvolvimento e sujeitos de direitos civis, humanos e sociais assegurados na Constituição Federal de 1988.

LIBERDADE de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; opinião e expressão; crença e culto religioso; brincar, praticar esportes e divertir-se; participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; participar da vida política, na forma da lei; buscar refúgio, auxílio e orientação. (artigo 16 da lei).


RESPEITO no que tange à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. (artigo 17).

DIGNIDADE no sentido de colocá-los a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico (uso de força física, com o intuito disciplinar ou punitivo, que resulte em sofrimento físico ou lesão) ou de tratamento cruel ou degradante (sob a forma de humilhação, ameaça grave, ridicularização), como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los. (artigo 18 e 18-A).

O ECA trata pontualmente de questões concernentes à família natural e substituta, guarda, tutela, adoção (nacional e internacional); educação, cultura, esporte e lazer; profissionalização e proteção no trabalho; proteção no que diz respeito à informação, cultura, diversões e espetáculos, produtos e serviços; autorização para viajar; política de atendimento - políticas sociais básicas, assistência social, serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão, serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos. 

Dispõe também sobre aspectos relacionados à medidas de proteção de crianças e adolescentes, Conselho Tutelar, crimes em espécie cometidos contra menores, e ainda sobre a prática de ato infracional (condutas descritas como crime ou contravenção penal) e medidas aplicáveis aos adolescentes, as quais levam em conta a sua capacidade de cumpri-las, as circunstâncias e a gravidade da infração.

sexta-feira, 3 de julho de 2020

As Várias Faces da Violência Contra a Mulher

Além da agressão física, a Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340/06) tutela outros tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher, que podem se dar nas modalidades psicológica, sexual, patrimonial e moral. Assim, nos termos do artigo 7.º:

Art. 7.º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
(grifos nossos)

Instituto Maria da Penha (clique no link), organização não governamental sem fins lucrativos fundada em 2009, está ligado à história de vida de Maria da Penha, símbolo da luta no combate à violência doméstica contra a mulher. Na página mantida na internet, o IMP reúne informações diversas sobre a temática, e inclusive disponibiliza, de forma bastante didática, mapas com exemplos práticos de cada um dos tipos de violência que podem ser praticados contra a mulher, os quais transcrevemos abaixo: