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quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

AME, Zolgensma e SUS

Há dois anos, escrevemos aqui no ::BLoG:: sobre a AME - Uma Corrida Contra o Tempo, doença muscular neurodegenerativa evolutiva. À época, apresentamos dois bebês gaúchos, Enzo e Emanuel, que aguardavam sua preciosa dose de Zolgensma, tratamento de terapia gênica mais indicado para a enfermidade, que atingia, à época, o astronômico valor de 12 milhões de reais. O alto custo do medicamento se dá em razão de ser "medicamento órfão" que atua corrigindo o defeito na base, ou seja, insere o material genético modificado no organismo da criança.

Embora já estivesse devidamente registrado perante a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) desde agosto de 2020, somente nesta semana o Zolgensma (cujo nome nome científico é onasemnogeno abeparvoveque) foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) pelo Ministério da Saúde.

Conforme expressa recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Novas Tecnologias em Saúde (CONITEC), a medicação deverá ser aplicada sob os seguintes critérios/ exigências: somente em bebês de até 06 (seis) meses de idade e que estejam tratando os efeitos da atrofia muscular espinhal sem a necessidade de ventilação invasiva por mais de 16 (dezesseis) horas diárias.

Ocorre que, em mais da metade dos casos, a AME tipo 1 (forma mais grave da doença) é diagnosticada após os 06 (seis) meses de idade e, em crianças de tão tenra idade, com fraqueza muscular severa, a ventilação por meio de tubo endotraqueal (naso ou orotraqueal) ou cânula de traqueostomia é utilizada em extensos períodos de tempo, o que, pela recomendação da CONITEC, inviabilizaria a concessão do Zolgensma.

É muito difícil que se tenha o diagnóstico precoce dessa doença rara, eis que os sintomas por vezes demoram a aparecer, excluindo a possibilidade de aplicação da terapia gênica. Seguem alguns importantes sinais a serem avaliados, conforme pediatras: o bebê não firma a cabeça; o corpo é mais mole (hipotonia); movimenta menos as pernas do que os braços; tem uma respiração que movimenta mais o abdômen do que o tórax; apresenta tremor na língua e incapacidade de engolir.

O medicamento será disponibilizado na rede pública de saúde em até 180 (cento e oitenta) dias, prazo necessário para os procedimentos de compra, distribuição e elaboração do protocolo clínico para uso. 

Ainda, em razão de expressa previsão legal contida no § 10 do artigo 10 da Lei n.º 9.656/98, incluído pela Lei n.º 14.307/2022, o tratamento também deverá ser incluído no Rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) entre as terapias cobertas pelos planos, eis que a nova legislação estabelece que "as tecnologias avaliadas e recomendadas positivamente pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), instituída pela Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011, cuja decisão de incorporação ao SUS já tenha sido publicada, serão incluídas no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar no prazo de até 60 (sessenta) dias".


quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Atuação Ampliada dos Fisioterapeutas

Recentemente, por ocasião do julgamento de Embargos de Declaração no Recurso Especial n.º 1.592.450, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que diagnosticar doenças e prescrever tratamentos não se trata de atividade privativa do médico, ampliando a área de atuação dos Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais. 

Assim, é possibilitado a estes profissionais solicitar laudos e exames, receber demanda espontânea, elaborar diagnóstico específico de sua área de atuação, bem como prescrever programas de tratamento.

O debate na Corte deu-se em razão de recursos interpostos pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (CREMERS) e Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (SIMERS), questionando suposta invasão de suas atribuições privativas, por entenderem as referidas entidades que as funções do fisioterapeuta e terapeuta ocupacional deveriam limitar-se à execução das técnicas e dos métodos prescritos pelos médicos, tese esta que não foi acatada pelo STJ.

Segue a ementa do acórdão:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTROLE DE LEGALIDADE. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE NORMA INFRALEGAL. POSSIBILIDADE. RESOLUÇÕES NORMATIVAS. CONSELHO DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL. AUTORIZAÇÃO. ATO RESERVADO A MÉDICOS. IMPOSSIBILIDADE.

1. Embora não caiba a este Tribunal examinar o pedido de inconstitucionalidade de norma em face da Constituição, é possível promover o exame da legalidade das resoluções normativas que eventualmente tenham contrariado o Decreto-lei n. 938/1969.

2. No caso, como o pedido da inicial foi deduzido de ambas as maneiras (declaração de ilegalidade e inconstitucionalidade), a ação civil pública é viável, ao menos em relação ao primeiro pleito, sendo os autores partes legítimas para deduzi-lo.

3. O exercício das profissões de fisioterapeuta e terapeuta ocupacional se desenvolve de acordo com os parâmetros dispostos Decreto-lei n. 938/1969 (art. 1º), que, em seus arts. 3º e 4º, expressamente reservou aos profissionais a atividade de executar métodos e técnicas fisioterápicos, terapêuticos e recreacionais.

4. Não há, na norma de caráter primário, autorização para que os fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais desempenhem atividades como as de receber demanda espontânea, realizar diagnóstico, prescrever ou realizar exames sem assistência médica, ordenar tratamento e dar alta terapêutica, atividades reservadas aos médicos.

5. O STF, no julgamento da Representação 1.056/DF, considerou constitucionais os arts. 3º e 4º do Decreto-lei n. 938/1969 e o art. 12 da Lei n. 6.316/1975 e bem delimitou as atividades do fisioterapeuta e do terapeuta ocupacional: a) ao médico cabe a tarefa de diagnosticar, prescrever tratamentos, avaliar resultados; b) ao fisioterapeuta e ao terapeuta ocupacional, diferentemente, cabe a execução das técnicas e métodos prescritos (STJ, REsp 693.454/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, Segunda Turma, julgado em 03/11/2005, DJ 14/11/2005, p. 267).

6. Hipótese em que a interpretação sistemática entre os arts. 1º, 3º e 4º do Decreto-lei n. 938/1969 e os arts. 1º, 2º, parágrafo único, II, 4º, X, XI e XIII e §§1º e 7º, da Lei n. 12.842/2013 reforça as conclusões antes adotadas por esta Corte e pelo Supremo.

7. Deve ser mantida a possibilidade da prática da acupuntura, quiropraxia, osteopatia e fisioterapia e terapia ocupacional do trabalho pelos fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, porque, quanto a elas, não há comando secundário em abstrato que, pela só existência, vulnere os preceitos normativos primários que disciplinam as atividades de fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, ou mesmo médicos.

8. Recurso especial parcialmente provido.

(REsp n. 1.592.450/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 30/6/2022.). Grifos nossos.