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terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Sucessão da Titularidade do Plano de Saúde

Ao tratar sobre a manutenção do ex-empregado exonerado ou despedido sem justa causa e do funcionário que se aposentou como beneficiário do plano de saúde coletivo empresarial, a Lei n.º 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde) assim dispôs:

Art. 30.  Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.                    

Art. 31.  Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.   

Mas e quando o titular do plano de saúde falece? Como ficam seus dependentes?

Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em uma leitura ampliada/ interpretação extensiva dos artigos 30 e 31 da Lei dos Planos de Saúde, entendeu que o idoso dependente do titular que veio a óbito, e que teve mais de 10 (dez) anos de contribuição, poderá assumir a titularidade do plano de saúde coletivo por adesão por prazo indeterminado - enquanto estiver vigente o contrato firmado entre a empresa (estipulante) e a Operadora e desde que arque integralmente com o valor das mensalidades.

Inclusive, é possível a Rescisão do Plano de Saúde Empresarial e Migração para Plano Individual ou Familiar com o aproveitamento de carências (clique no link para ler).

Importa consignar aqui que algumas empresas oferecem o benefício da REMISSÃO de forma expressa em seus contratos - assim, em caso de falecimento do titular, é possível a manutenção do plano para os dependentes automaticamente por até 05 (cinco) anos.

Assim, em observância à regra de que onde há a mesma razão de ser, prevalece a mesma razão de decidir; ou, onde houver o mesmo fundamento, haverá o mesmo direito, restou reconhecido o direito dos dependentes do aposentado falecido a postular a sucessão da titularidade do plano.

Importa dizer que, neste caso, a Lei dos Planos de Saúde foi aplicada em sintonia com a Lei n.º 10.741/03 - Estatuto do Idoso. Isso porque a pessoa idosa é considerada hipervulnerável no mercado de consumo (e aos planos de saúde se aplica também o Código de Defesa do Consumidor - Lei n.º 8.078/90) e deve receber um tratamento diferenciado por parte do serviço, tendo preservado seu direito à assistência à saúde.

Leia também:

Rescisão Unilateral de Contrato - Plano de Saúde x Idosos

Segue abaixo a ementa do julgado de relatoria da Ministra Nancy Andrighi:


RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. CONTRATO COLETIVO POR ADESÃO. FALECIMENTO DO TITULAR. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 30 E 31 DA LEI 9.656/1998. DEPENDENTE IDOSA. CONTRIBUIÇÃO HÁ MAIS DE 10 ANOS. CONDIÇÃO DE CONSUMIDOR HIPERVULNERÁVEL. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO POR PRAZO INDETERMINADO.

1. Ação de obrigação de fazer c/c compensação por dano moral ajuizada em 03/05/2019, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 17/12/2021 e concluso ao gabinete em 14/10/2022.

2. O propósito recursal consiste em decidir sobre a manutenção no plano de saúde coletivo por adesão, por prazo indeterminado, de pessoa idosa, dependente do titular falecido.

3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 1.022, II, do CPC/15.

4. Falecendo o titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei 9.656/1998.

5. O beneficiário idoso, que perde a condição de dependente em virtude do falecimento do titular, depois de mais de 10 anos de contribuição, tem o direito de assumir a titularidade do plano de saúde coletivo por adesão, por prazo indeterminado, enquanto vigente o contrato celebrado entre a operadora e a estipulante e desde que arque com o custeio integral, sem prejuízo de exercer, a qualquer tempo, o direito à portabilidade de carências para contratação de outro plano de saúde.

6. Recurso especial conhecido e desprovido, com majoração de honorários.

(REsp n. 2.029.978/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023.)


sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Dívida Prescrita, Dívida Inexigível

Sempre que um direito é violado, nasce uma pretensão = direito de ajuizar ação. 

Por seu turno, o instituto da prescrição determina a extinção desse direito de ação pelo decurso de tempo, que pode ser geral (10 anos) ou específica a depender da matéria (1 a 5 anos).

Inclusive, há uma máxima no mundo jurídico que diz que "o direito não socorre aos que dormem" - do latim dormientibus non sucurrit jus. Em outras palavras: para todo problema há uma solução, desde que a justiça seja buscada no tempo devido (dentro do prazo legal).

Para exercer o direito de cobrança judicial de dívidas de bancos e cartões de crédito, o prazo previsto no Código Civil de 2002 é de 05 (cinco) anos, conforme dispõe o artigo 206, § 5.º, inciso I:

Art. 206. Prescreve: (...)

§ 5º Em cinco anos:

I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

Até então, embora prescritas pelo decurso de tempo, as dívidas podiam ser objeto de cobrança extrajudicial, o que geralmente se dava através de empresas de recuperação de créditos/ escritórios especializados em cobrança - que telefonavam exaustivamente para os devedores, nos mais diversos horários, bem como enviavam e-mails e mensagens de texto por SMS e WhatsApp, inclusive a inscrição do nome do devedor em plataformas de renegociação de dívidas como a do Serasa Limpa Nome (e, por consequência, impactando negativamente no score do consumidor), até que estes acabavam por efetuar o pagamento. 

Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que, embora a dívida permaneça existindo no mundo dos fatos, em estando prescrita a pretensão, se torna inexigível, ou seja, não mais poderá ser objeto de cobrança judicial, tampouco por qualquer meio na seara extrajudicial.

Segue trecho da ementa do julgado de relatoria da Ministra Nancy Andrighi:


DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO PRESCRITO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO. INSTITUTO DE DIREITO MATERIAL. DEFINIÇÃO. PLANO DA EFICÁCIA. PRINCÍPIO DA INDIFERENÇA DAS VIAS. PRESCRIÇÃO QUE NÃO ATINGE O DIREITO SUBJETIVO. COBRANÇA EXTRAJUDICIAL DE DÍVIDA PRESCRITA. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO ESTADUAL. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO PRESCRITO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO. INSTITUTO DE DIREITO MATERIAL. DEFINIÇÃO. PLANO DA EFICÁCIA. PRINCÍPIO DA INDIFERENÇA DAS VIAS. PRESCRIÇÃO QUE NÃO ATINGE O DIREITO SUBJETIVO. COBRANÇA EXTRAJUDICIAL DE DÍVIDA PRESCRITA. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO ESTADUAL.

1. Ação de conhecimento, por meio da qual se pretende o reconhecimento da prescrição, bem como a declaração judicial de inexigibilidade do débito, ajuizada em 4/8/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 26/9/2022 e concluso ao gabinete em 3/8/2023.

2. O propósito recursal consiste em decidir se o reconhecimento da prescrição impede a cobrança extrajudicial do débito.

3. Inovando em relação à ordem jurídica anterior, o art. 189 do Código Civil de 2002 estabelece, expressamente, que o alvo da prescrição é a pretensão, instituto de direito material, compreendido como o poder de exigir um comportamento positivo ou negativo da outra parte da relação jurídica.

4. A pretensão não se confunde com o direito subjetivo, categoria estática, que ganha contornos de dinamicidade com o surgimento da pretensão. Como consequência, é possível a existência de direito subjetivo sem pretensão ou com pretensão paralisada.

5. A pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias, podendo ser exercida tanto judicial, quanto extrajudicialmente. Ao cobrar extrajudicialmente o devedor, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão, ainda que fora do processo.

6. Se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada em razão da prescrição, não será mais possível exigir o referido comportamento do devedor, ou seja, não será mais possível cobrar a dívida. Logo, o reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

7. Hipótese em que as instâncias ordinárias consignaram ser incontroversa a prescrição da pretensão do credor, devendo-se concluir pela impossibilidade de cobrança do débito, judicial ou extrajudicialmente, impondo-se a manutenção do acórdão recorrido.

8. Recurso especial conhecido e desprovido.

(REsp n. 2.088.100/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 17/10/2023, DJe de 23/10/2023.)

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Leia também os seguintes artigos (clique nos links):


Inscrição de Dívidas no SPC/Serasa

Contagem.Prazo.Inscrição.Dívida.Cadastro.Inadimplente

Cadastros Restritivos de Crédito e Responsabilidade do Credor


domingo, 3 de dezembro de 2023

Internet Banking, Boletos, Fishing

A cada dia, novos e engenhosos golpes aparecem em terrae brasilis: Falso Empréstimo Consignado, falso pedido de PIX pelo WhatsAppEstelionato Sentimental e agora o falso boleto bancário (clique nos links para ler os artigos).

Desde o seu surgimento no início dos anos 90, os boletos bancários passaram a representar verdadeira comodidade para os clientes das instituições, dada a facilidade para a realização de pagamentos.

Diante da tecnologia atual, esta praticidade também trouxe consigo o risco de fraudes no mundo virtual, através da emissão de boletos de cobrança por meio do Internet Banking. Isso porque é plenamente possível ocorrer uma falsificação do documento, que acaba computando o pagamento na conta bancária do fraudador, e não do efetivo credor, causando um prejuízo duplo (perda do numerário para o golpista e necessidade do adimplemento ao real destinatário).

Recentemente, por ocasião do julgamento do Recurso Especial n.º 2.046.026, o Superior Tribunal de Justiça afastou a obrigação de uma instituição financeira na hipótese de pagamento de boleto fraudado, diante da inexistência de falha na prestação do serviço. Isso porque, na análise das provas, o tribunal verificou tratar-se de fato externo, ocorrido fora da rede bancária - logo, culpa exclusiva de terceiro, eximindo o banco da responsabilidade civil.

Súmula n.º 479 do STJ informa que " as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias."  

Assim, temos que, nos casos de fortuito interno, ou seja, quando o consumidor foi levado a erro por preposto do banco ou pelos canais oficiais de atendimento a ele vinculados, e for devidamente comprovada a falha no sistema interno, a instituição financeira possui responsabilidade objetiva e responde pelos danos ocasionados. 

Todavia, em sendo caso de fortuito externo, ou seja, fora da rede bancária, plenamente afastada está a aplicação da Súmula supramencionada.

Desse modo, alguns cuidados se fazem imprescindíveis: boletos bancários recebidos por e-mail devem ser atentamente analisados. Há de ser feita uma checagem de todos os dados constantes no título e verificação do emissor do e-mail - é de titularidade do banco? foi emitido pelo canal oficial da financeira ou pode ser terceiro estelionatário (destinatário distinto daquele legítimo), através da prática de fishing?

Fishing = "pesca" de dados realizadas por fraudadores, por meio de falsos sites, ligações telefônicas e e-mails, em que se apresentam como funcionários das instituições e solicitam informações/ confirmação de dados pessoais para realizar transações bancárias, ou seja, efetivar o golpe.

Logo, boletos só devem ser pagos quando emitidos pela plataforma bancária oficial, cabendo ao consumidor agir com cautela e atenção, de modo a verificar a autenticidade do documento, conferindo todos os dados antes de realizar o pagamento por meio virtual. Isso porque, além de incidir a culpa exclusiva de terceiro (estelionatário), é possível a configuração de culpa exclusiva daquele que sofreu o golpe, por negligência quanto a seus dados bancários e desídia quanto à não conferir as informações com a devida acuidade. Portanto, FIQUE ATENTO.