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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Consumo no Verão e Direito à Informação

Ao retomar as postagens do blog, passado o Carnaval e período de férias de verão, hoje falaremos sobre um aspecto negativo infelizmente bastante observado nas praias situadas na costa brasileira: a ausência de informações claras e precisas aos consumidores. Por certo que  o ambiente de um restaurante, bar, quiosque ou casa noturna no litoral é muito mais informal e despojado do que aqueles situados nas grandes e médias cidades. Porém, referidos locais em que são consumidos alimentos e bebidas não estão isentos do cumprimento dos ditames do Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei n.º 8.078/90). 

Não obstante a palavra de ordem seja PUBLICIDADE, para fins de evitar mal-entendidos e constrangimentos, exemplos de desacordo com a norma legal não faltam: ausência de cardápio com os preços afixados na porta/ entrada do estabelecimento e de anúncio sobre as formas de pagamento aceitas no local (moeda corrente, cartão de crédito, cheque), falta de informação prévia acerca da cobrança de couvert individual (alimentos e/ou artístico), incidência automática dos 10% sobre o total do consumo (a título de gorjeta aos garçons da casa), dentre outros.  Inclusive, em post anterior já tratamos sobre a necessária Visibilidade dos Preços dos Produtos e Serviços aos Consumidores.

No que tange ao couvert, importa salientar que tanto o de entrada (aperitivos), quanto o artístico - remuneração dos músicos que se apresentam no local, tornando o ambiente mais agradável e animado - poderá ser cobrado desde que a informação acerca dos dias e horários de shows, bem como de seu valor, seja ostensiva e previamente apresentada aos clientes. É de mencionar que a entrega de produtos e serviços sem a solicitação prévia do consumidor equipara-se à mera cortesia ou amostra grátis, isentando o seu pagamento, conforme expressamente disposto no artigo 39, inciso III e parágrafo único, do CDC. 

Relativamente aos controversos "10%" (também denominados "taxa de serviço") não é demais lembrar que a sua cobrança impositiva é totalmente ilegal e abusiva, posto que no preço praticado pelo estabelecimento está naturalmente embutida/ englobada a remuneração de todos os funcionários/ prestadores de serviços do bar, restaurante ou quiosque. Ora, se a intenção dos 10% é premiar o bom atendimento dos garçons, por meio de uma gratificação, por certo que 0 pagamento de gorjeta não pode ser tarifado e é puramente opcional. Assim, o consumidor só é obrigado a adimplir o valor dos alimentos e bebidas consumidos, consoante discriminados no cardápio, de forma clara e precisa, vide artigo 30, do CDC.

E quando o valor das bebidas (cervejas, destilados, drinks) não consta do cardápio? Essa situação é bastante comum nos meses de dezembro a março, quando pequenas etiquetas brancas são coladas no menu, onde geralmente consta a seguinte expressão: "consulte o garçom". Essa prática, que visa a majoração dos lucros da atividade comercial na época mais quente do ano, em que há o aumento exponencial no consumo de bebidas alcoólicas, destoa completamente das normas protetivas do consumidor, por ferir a necessária publicidade e transparência nas relações, além de ser contrária ao previsto no artigo 39, inciso X, do CDC.

Outro direito do consumidor que muitas vezes é sonegado é o que diz respeito à informação, por parte do fornecedor, do tempo razoável de espera para o cumprimento de sua obrigação de servir os alimentos/ bebidas após efetuado o pedido. Especialmente no verão, com a grande circulação de visitantes e turistas, muitos estabelecimentos no litoral acabam despendendo um tempo desproporcional no preparo e entrega dos pedidos à mesa. Assim, em havendo demora injustificada e excessiva quanto ao tempo de espera inicialmente informado (vide artigo 39, inciso XII, do CDC), cabe ao consumidor optar entre aguardar a prestação do serviço ou cancelar o pedido sem qualquer custo, caso tenha intenção de retirar-se do local (muitas vezes para fazer a refeição em outro ambiente).

Prática bastante difundida nas casas noturnas em tempos passados, a cobrança de consumação é expressamente proibida, uma vez que não há como se obrigar o cliente a comer e beber o correspondente a determinada quantidade mínima, sob pena de configuração de cobrança indevida e consequente devolução em dobro (artigo 42, parágrafo único, do CDC). Da mesma forma, referida imposição caracteriza venda casada (artigo 39, inciso I, do CDC), uma vez que condiciona o fornecimento de um serviço (no caso, a entrada no local) à aquisição de outro produto ou serviço (no caso, o consumo de alimentos/ bebidas). 

Por outro lado, a cobrança de ingresso ou entrada no estabelecimento comercial é plenamente viável, desde que previamente informada, por óbvio. 

No caso de perda da comanda, é ilegal e abusiva a imposição de pagamento de valores muitas vezes significativamente superiores à média de consumo normal. É de ressaltar que cabe unicamente ao estabelecimento comercial realizar o controle do que é consumido, não sendo possível a transferência de tal obrigação aos clientes. O ideal seria a entrega de uma comanda física (papel, cartão) ao consumidor e a anotação dos pedidos pelo fornecedor em sistema de controle próprio (via de regra informatizado). Assim, em caso de extravio da consumação por parte do cliente, haveria a comanda virtual para fins de aferição do valor devido. Uma forma ainda mais simples e eficiente é a venda de tíquetes ou fichas.

Desse modo, em não sendo tomada nenhuma medida acautelatória (controle paralelo) por parte de bares, restaurantes e casas noturnas, quando houver perda da comanda física pelo cliente é possível apenas e tão somente a cobrança daquilo que for declaradamente consumido pelo consumidor.

Vale dizer que mostra-se contrária à lei a aplicação de todo e qualquer tipo de multa bem como o uso de técnicas de coação ao pagamento, seja pela intimidação verbal ou agressão física por parte de seguranças, seja pela proibição de sair do local ou encaminhamento às famigeradas "salinhas". Aliás, referidas condutas ilegais caracterizam fielmente os crimes de constrangimento ilegal, ameaça, lesão corporal, extorsão e cárcere privado, todos previstos no Código Penal brasileiro e, a depender da lesão aos atributos da personalidade, não impedem o ajuizamento simultâneo de uma ação de reparação civil (indenizatória).

Independentemente da época do ano e local da prestação dos serviços, cabe ao cliente conhecer e exigir do fornecedor o respeito e a observância dos dispositivos previstos no Código de Defesa do Consumidor e, nos casos mais específicos, da lei civil, penal e constitucional. Consumidor consciente, faça valer seus direitos!