Nos últimos meses, foram inúmeros os episódios de fenômenos naturais extremos (ventos, tempestades, inundações, ciclones) que ocasionaram queda/ interrupção de energia elétrica por diversos dias no estado do Rio Grande do Sul.
É evidente que as mudanças climáticas têm aumentado a frequência e gravidade dos eventos danosos. Na mesma proporção, cresceram de forma vertiginosa as ações judiciais determinando que as empresas concessionárias restabeleçam os serviços de energia elétrica em determinados prazos, sob pena de aplicação de elevadas multas (a serem calculadas levando-se em conta o número de unidades consumidoras atingidas). Algumas decisões, inclusive, determinam a apresentação de planos de contingência e de ações emergenciais visando evitar que o fato não se repita no futuro.
Por certo que não é possível ao ser humano prever/ interferir/ evitar a ocorrência de eventos climáticos como chuvas e ventos, ainda mais os de grande magnitude. Porém, o Judiciário tem entendido que cabe às concessionárias ampliar, melhorar e reparar as suas redes para melhor atender à população (unidades residenciais, prestadoras de serviços essenciais e contínuos e comércio).
Importa consignar que, diante da tecnologia cada vez mais avançada, por vezes as tempestades extremas podem ser previstas com antecedência - tanto que são emitidos alertas meteorológicos indicando a possibilidade de ocorrência. Assim, é plenamente possível que as concessionárias de energia ajam preventivamente de modo a evitar, ou pelo menor amenizar, os prejuízos experimentados.
Inclusive, os tribunais superiores já sedimentaram o entendimento de que a ocorrência de intempéries do tempo, como chuvas e temporais, não exclui o dever de indenizar, uma vez que se trata de eventos previsíveis, cabendo à concessionária manter infra-estrutura capaz de impedir ou minimizar os danos deles decorrentes - sendo ônus da empresa eventualmente comprovar a excepcional gravidade do evento climático, cujas proporções foram por demais extensas (apta a ensejar o reconhecimento de uma excludente de responsabilidade - caso fortuito, força maior), a ponto de impedir a normalização dos serviços em tempo razoável.
Nos termos do artigo 362 da Resolução Normativa n.º 1.000/2021 da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) - a qual revogou a RN n.º 414/2010, os prazos para religação/ restabelecimento do serviço da luz são:
Art. 362. A distribuidora deve restabelecer o fornecimento de energia elétrica nos seguintes prazos, contados de forma contínua e sem interrupção:
I - 4 horas: para religação em caso de suspensão indevida do fornecimento;
II - 4 horas: para religação de urgência de instalações localizadas em área urbana;
III - 8 horas: para religação de urgência de instalações localizadas em área rural;
IV - 24 horas: para religação normal de instalações localizadas em área urbana; e
V - 48 horas: para religação normal de instalações localizadas em área rural.
No final do mês de janeiro deste ano, partes da cidade de Porto Alegre ficaram mais de uma semana sem energia elétrica, quando o Ministério Público ajuizou ação em face da empresa prestadora visando o restabelecimento dos serviços, além da responsabilização e consequente condenação ao ressarcimento dos prejuízos enfrentados (materiais e morais), além da aplicação de multas milionárias.
Sempre importante lembrar que as concessionárias de serviços públicos, por força de expressa previsão legal, devem obedecer os mesmos princípios aplicáveis à Administração Pública, elencados no caput do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, a saber: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Nos exatos termos do § 6.º do referido artigo, as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Ademais, plenamente aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor, em especial os artigos a seguir transcritos:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
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Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido.
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Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.
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Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.
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