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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Boas Festas II

Em virtude do período de recesso e férias forenses (20/12 a 20/01/2014), a blogueira que vos escreve dará uma pausa nos posts semanais, para voltar em 2014 cheia de gás e novos artigos jurídicos sobre temas polêmicos e interessantes. 

Desejo a todos que nos acompanham um Natal com muita paz, amor e saúde, na presença do Senhor, e um Ano Novo repleto de alegrias, conquistas e realização de projetos e sonhos.

Que nossa fé e esperança se renovem e 2014 seja um ano especial e iluminado para todos nós!

Boas Festas!

domingo, 15 de dezembro de 2013

Isenção de Tarifas em Conta-Salário

A abertura de conta-salário pelas empresas da iniciativa privada para fins de execução da folha de pagamento de seus funcionários via instituição financeira passou a ser obrigatória em 02/01/2009. Já para os servidores e empregados públicos a adoção desse sistema tornou-se compulsória a partir de 02/01/2012. Antes disso, o pagamento dos salários podia ser realizado mediante depósito em contas bancárias comuns. 

Conforme definição do Banco Central do Brasil (BACEN), conta-salário

é um tipo especial de conta de registro e controle de fluxo de recursos, destinada a receber salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias, pensões e similares. A "conta-salário" não admite outro tipo de depósito além dos créditos da entidade pagadora e não é movimentável por cheques.

Por ser um tipo de conta bancária destinada unicamente a RECEBER os vencimentos, não é possível a cobrança das seguintes tarifas:

Sobre esse tipo de conta é vedada a cobrança de tarifa nas transferências dos recursos para outra instituição financeira, para crédito à conta de depósito de titularidade do beneficiário, conjunta ou não, desde que esses valores sejam transferidos pelo valor total creditado, admitida a dedução de parcelas de empréstimo, de financiamento ou de arrendamento mercantil, contratados na "conta-salário".

Na transferência parcial do crédito para outra instituição financeira pode ser cobrada tarifa, mesmo que seja uma só transferência.

Se a transferência for para outra conta na mesma instituição financeira, é vedada a cobrança de tarifa nas transferências pelo valor total ou parcial dos créditos.

Da mesma forma não podem ser cobradas tarifas por:

* fornecimento de cartão magnético, a não ser nos casos de pedidos de reposição decorrentes de perda, roubo, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição financeira;

* realização de até cinco saques, por evento de crédito;

* acesso a pelo menos duas consultas mensais ao saldo nos terminais de auto-atendimento ou diretamente no guichê de caixa;

* fornecimento, por meio dos terminais de auto-atendimento ou diretamente no guichê de caixa, de pelo menos dois extratos contendo toda a movimentação da conta nos últimos trinta dias;

* manutenção da conta, inclusive no caso de não haver movimentação.

Na hipótese da instituição bancária efetuar descontos indevidos na conta-salário (tais como as cestas de serviços), é possível ingressar com ação judicial requerendo a devolução em dobro das quantias debitadas, com base no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a relação de consumo existente entre as partes.

Ademais, além dos danos materiais causados ao titular da conta-salário, o banco poderá ser condenado ao pagamento de uma indenização pela quebra da boa-fé objetiva e seus deveres anexos, tais como o de informação, transparência, lealdade, cooperação e clareza. Inclusive porque, em havendo falha na prestação do serviço, a instituição responde objetivamente (artigo 14 do CDC).

sábado, 7 de dezembro de 2013

Dano Moral via Facebook

Publicar, curtir, comentar, compartilhar: palavras bastante conhecidas por quem transita nas redes sociais, visita perfis e lê postagens no mural de familiares, amigos, colegas e até mesmo de pessoas estranhas. Embora o objeto de nossas maiores atenções sejam as notícias e artigos que nos deixam felizes, não raro nos deparamos com posts que causam raiva, indignação e revolta, especialmente quando envolvem violação de direitos humanos e maus tratos a animais. Para além de gerar comentários, muitas vezes tais mensagens ensejam compartilhamentos (dezenas, centenas, milhares até), porém nem sempre correspondem à verdade... surge então o dever de indenizar o ofendido.

Na semana que passou, decisão importante em relação ao tema foi proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, oportunidade em que duas mulheres foram condenadas ao pagamento de R$ 20 mil a título de danos morais a um veterinário, em razão de uma publicação contendo a narrativa de fatos não devidamente comprovados e que acabou sendo compartilhada no Facebook.

Em síntese, uma das mulheres publicou a foto de um animal de estimação em precário estado de saúde após cirurgia de castração realizada pelo veterinário em questão. Além da imagem, redigiu um texto imputando ao profissional a responsabilidade pela situação, acusando-o de negligência quanto ao trato da cachorrinha. Por seu turno, a outra mulher curtiu e compartilhou o post, baseada apenas nas suposições da amiga.

Por ocasião do julgamento do recurso, irretocável o voto do relator, Desembargador José Roberto Neves Amorim, ao asseverar que

“se por um lado o meio eletrônico tornou mais simples a comunicação entre as pessoas, facilitando também a emissão de opinião, sendo forte ferramenta para debates em nossa sociedade e denúncias de inúmeras injustiças que vemos em nosso dia-a-dia, por outro lado, trouxe também, a divulgação desenfreada de mensagens que não condizem com a realidade e atingem um número incontável de pessoas, além da manifestação precipitada e equivocada sobre os fatos, dificultando o direito de resposta e reparação do dano causado aos envolvidos”.

Não é demais lembrar que a Internet, por seu intenso tráfego de informações e facilidade de acesso aos dados ali expostos, os quais repercutem quase que instantaneamente - mormente em casos como o narrado, cuja gravidade da acusação é apta a causar comoção popular - possui um poder altamente destrutivo. Portanto, há de se ter cuidado com o que postamos, comentamos, curtimos e compartilhamos na rede, pois imputar um fato gravoso a alguém, especialmente em um momento de ímpeto e sem qualquer prova do alegado, pode causar danos imensos e até mesmo destruir uma carreira, por irresponsabilidade de quem publica e de quem replica, eis que a divulgação pode aumentar a visibilidade (e os prejuízos ao direito de personalidade do acusado) de forma exponencial.


Apelação nº 4000515-21.2013.8.26.0451 (TJSP)

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Direito à Vida x Direito à Morte

A Constituição Federal de 1988 dispõe, no caput de seu artigo 5.º, que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)" Ademais, prevê expressamente em seu artigo 1.º, inciso III, tratar-se de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil "a dignidade da pessoa humana."

Por outro lado, o Código Civil de 2002, em seu artigo 15, dispõe que "ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica."

Da leitura dos dispositivos legais acima transcritos, temos que o direito à vida e à dignidade humana, embora protegidos pelo nosso ordenamento pátrio, pode ser relativizado quando o indivíduo titular desses direitos assim o quiser.

Nesse sentido é a novel decisão oriunda da 1.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que negou provimento a recurso manejado pelo Ministério Público Estadual, o qual visava obter uma autorização judicial para suprir a vontade de um cidadão idoso que se recusou a realizar uma cirurgia para amputação de um dos pés que se encontrava necrosado, o que poderia acarretar em uma infecção generalizada e por consequência seu óbito.

No caso concreto, o TJRS confirmou a sentença prolatada pelo Magistrado de primeira instância, no sentido de que não pode o Estado interferir na vontade expressamente manifestada por um paciente - de morrer com dignidade - obrigando-o a submeter-se a procedimento cirúrgico sem a sua vontade e consentimento, ainda que tal providência seja fundamental para a manutenção de sua vida.

Nesse sentido é a ementa do julgado:


APELAÇÃO CÍVEL. ASSISTÊNCIA À SAÚDE. BIODIREITO. ORTOTANÁSIA. TESTAMENTO VITAL. 1. Se o paciente, com o pé esquerdo necrosado, se nega à amputação, preferindo, conforme laudo psicológico, morrer para "aliviar o sofrimento"; e, conforme laudo psiquiátrico, se encontra em pleno gozo das faculdades mentais, o Estado não pode invadir seu corpo e realizar a cirurgia mutilatória contra a sua vontade, mesmo que seja pelo motivo nobre de salvar sua vida. 2. O caso se insere no denominado biodireito, na dimensão da ortotanásia, que vem a ser a morte no seu devido tempo, sem prolongar a vida por meios artificiais, ou além do que seria o processo natural. 3. O direito à vida garantido no art. 5º, caput, deve ser combinado com o princípio da dignidade da pessoa, previsto no art. 2º, III, ambos da CF, isto é, vida com dignidade ou razoável qualidade. A Constituição institui o direito à vida, não o dever à vida, razão pela qual não se admite que o paciente seja obrigado a se submeter a tratamento ou cirurgia, máxime quando mutilatória. Ademais, na esfera infraconstitucional, o fato de o art. 15 do CC proibir tratamento médico ou intervenção cirúrgica quando há risco de vida, não quer dizer que, não havendo risco, ou mesmo quando para salvar a vida, a pessoa pode ser constrangida a tal. 4. Nas circunstâncias, a fim de preservar o médico de eventual acusação de terceiros, tem-se que o paciente, pelo quanto consta nos autos, fez o denominado testamento vital, que figura na Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina. 5. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70054988266, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 20/11/2013).

Importante dizer que o idoso de 79 anos de idade estava completamente lúcido e consciente de sua decisão, em pleno gozo de suas faculdades mentais, conforme laudo médico psiquiátrico realizado. Assim, em sendo escolha do paciente submeter-se à ortotanásia (não prolongação da vida por meios artificiais), cabe aos médicos respeitar a opção desejada. Referido tema, inclusive, já foi objeto de artigo publicado no blog em dezembro de 2010 (http://cintiadv.blogspot.com.br/2010/12/ortotanasia-x-eutanasia.html)

Aplicável, assim, o quanto contido na Resolução n.º 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, no que tange ao denominado "testamento vital", cujos pressupostos para a validade do ato extraímos de trecho da decisão do TJRS:

Tal manifestação de vontade, que vem sendo chamada de TESTAMENTO VITAL, figura na Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, na qual consta que “Não se justifica prolongar um sofrimento desnecessário, em detrimento à qualidade de vida do ser humano” e prevê, então, a possibilidade de a pessoa se manifestar a respeito, mediante três requisitos: (1) a decisão do paciente deve ser feita antecipadamente, isto é, antes da fase crítica; (2) o paciente deve estar plenamente consciente; e (3) deve constar que a sua manifestação de vontade deve prevalecer sobre a vontade dos parentes e dos médicos que o assistem.

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Resolução n.º 1995/2012 em sua íntegra:

http://www.bioetica.ufrgs.br/1995_2012.pdf