Anteriormente, tratamos aqui no ::BLoG:: sobre Os Direitos Fundamentais e mais especificamente acerca das Testemunhas de Jeová x Transfusão de Sangue (clique nos links para ler os artigos).
Nos últimos dias, o Supremo Tribunal Federal (STF) se debruçou sobre o tema liberdade religiosa e tratamento diferenciado em razão do julgamento de dois recursos extraordinários (RE n.º 979.742 e RE n.º 1.212.272). Ao ponderar e deliberar sobre o assunto, a Corte Superior, por unanimidade e em sede de repercussão geral (Temas 952 e 1.069), entendeu que, em havendo possibilidade de tratamento alternativo à transfusão de sangue no Sistema Único de Saúde (SUS), é obrigação do Estado assegurar a sua realização, devendo custear procedimento médico/ tratamento diferenciado a todos aqueles que, em razão de suas crenças e valores pessoais, não aceitam receber transfusão de sangue ao se submeter à cirurgia - ainda que haja a necessidade de deslocamento para outro Município ou viagem para outro Estado da federação que disponibilize os meios (como exemplo, a máquina de recuperação intraoperatória de sangue).
Todavia, tal decisão deve ser tomada de forma individual pelo paciente adulto de forma livre, consciente e esclarecida, ou seja, deve ser precedida de informação médica clara e completa acerca do diagnóstico, tratamento, benefícios e eventuais riscos do procedimento alternativo. A decisão particular é soberana, independentemente da opinião/ julgamento de terceiros, "de quanto possam parecer irracionais, imprudentes e ilógicas aos outros", nas palavras do Ministro Barroso. Com relação a crianças e adolescentes, há de prevalecer o princípio do melhor interesse para a vida e a saúde, sendo possível o tratamento diferenciado se não contrariar a indicação médica.
Um dos meios mais seguros de manifestar sua convicção/ autonomia individual é a escritura pública contendo as diretivas antecipadas de vontade, documento firmado em Tabelionato onde a pessoa informa sua consciência religiosa de não receber sangue/ plasma/ plaquetas.
Conforme explicitado pelo Ministro Barroso, relator de um dos recursos,
A dignidade humana exige o respeito à autonomia individual na tomada de decisões sobre a saúde e o corpo. Já a liberdade religiosa impõe ao Estado a tarefa de propiciar um ambiente institucional, jurídico e material adequado para que os indivíduos possam viver de acordo com os ritos, cultos e dogmas da sua fé, sem coerção ou discriminação.
Por seu turno, o relator do outro recurso, Ministro Gilmar Mendes, aduziu que
O direito à vida digna parte do pressuposto de que um adulto capaz e consciente pode dirigir suas ações e condutas de acordo com suas convicções, a significar que mesmo naquelas situações nas quais atuar com a fé professada põe a própria vida circunstancialmente em risco,, subsiste o direito de escolha a determinado tratamento de saúde”.
Em razão da liberdade religiosa e da autodeterminação, mostra-se legítima a recusa pelas Testemunhas de Jeová de tratamento que envolva transfusão de sangue, não sendo possível ao médico impor procedimento recusado por paciente no gozo de sua capacidade civil plena, de forma livre, consciente e informada.
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