Há pouco tempo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) lançou julgado inédito sobre tema que já vinha sendo amplamente debatido no Direito das Sucessões - a partilha do patrimônio digital do falecido. Quanto aos bens patrimoniais, sejam materiais ou imateriais (carros, casas, obras de arte, contas bancárias, ações, participações em empresas, direitos autorais, marcas, etc.), a lei é bastante clara e específica quanto à forma de avaliação e realização do inventário e partilha aos herdeiros.
Mas e no tocante aos bens existenciais, relacionados à vida virtual da pessoa? Como acessar e quantificar o intangível, a herança digital do de cujus, consistente em criptomoedas, milhas, redes sociais monetizadas no Youtube, Instagram, TikTok, Facebook? Se a legislação nada dispõe sobre o tema, como equilibrar os direitos fundamentais constitucionais do indivíduo com o valor econômico de seus pertences?
Por certo que a melhor alternativa, de modo a assegurar a vontade da parte, seria a formalização de um testamento, em vida, onde a própria pessoa decide o que sucederá com seus bens materiais e imateriais, nomeando um administrador de seus bens digitais. Mas na ausência deste, como resolver aspectos relacionados a acesso ao celular, notebook, Ipad, e-mails e redes sociais?
Quando do julgamento do Recurso Especial n.º 2.124.424, o STJ se deparou com a seguinte questão: decidir qual o procedimento para obtenção de informações acerca da existência de bens digitais contidos nos aparelhos eletrônicos de titularidade de falecido, face ao desconhecimento da senha de acesso.
O acórdão, de relatoria da nobre Ministra Nancy Andrighi, assim determinou:
6. Diante da existência de bens digitais no monte partível, é dever do juiz se cercar de todos os cuidados e garantias para compatibilizar, de um lado, o direito dos herdeiros à transmissão de TODOS os bens do falecido; de outro, os direitos de personalidade, especialmente a intimidade do falecido e/ou de terceiros.
7. Na hipótese de o falecido deixar bens digitais aos quais os herdeiros não tenham a senha de acesso, necessário se faz a instauração de incidente processual de identificação, classificação e avaliação de bens digitais, paralelo e apensado ao processo (associado à aba) de inventário.
Desse modo, surgiu a figura do inventariante digital, profissional especializado de confiança do Juiz que irá promover a busca de eventuais bens digitais transmissíveis nos aparelhos do falecido, guardando dever de sigilo e confidencialidade quanto a todos os segredos que porventura possa vir a tomar conhecimento em razão do mister (mensagens privadas, fotos íntimas). Desse modo, se resolve a transmissão e partilha de todos os bens do de cujus (analógicos e digitais), sem violar os direitos da personalidade (honra, intimidade, privacidade) do falecido ou de terceiros envolvidos.
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