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segunda-feira, 8 de julho de 2024

Maconha, 40 gramas: Usuário ou Traficante?

Em julgamento paradigmático (RE n.º 635.659), o Supremo Tribunal Federal, além de descriminalizar o porte e uso de maconha, definiu como parâmetro objetivo que a posse de até 40 gramas da erva (ou 06 plantas fêmeas de cannabis sativa) - a princípio e presumidamente - não configura tráfico de drogas. 

Isso porque a quantidade definida na tese fixada pela Corte Superior em sede de repercussão geral poderá ser relativizada: se houve prova de que a droga será objeto de venda (ter consigo balança de precisão, anotações sobre valores/clientes que denotem o intuito de comercialização, por exemplo), independentemente da quantidade encontrada, o portador será enquadrado como traficante. Por outro lado, ainda que a quantidade apreendida seja superior a 40 gramas, o Julgador poderá entender tratar-se de mero usuário e aplicar a atipicidade da conduta.

Importante ressaltar que o STF não está legalizando o uso da maconha, tendo decidido apenas em relação à natureza da punição a ser aplicada ao usuário, que deixa de ser tratado como alguém que cometeu um crime (ilícito penal) e passa a ser considerado alguém que praticou uma infração administrativa: nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei n.º 11.343/2006), a este serão aplicadas as sanções de advertência sobre os efeitos do uso da droga e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. A prestação de serviços à comunidade deixa de ser utilizada em razão de seu caráter punitivo. 

Sempre importante destacar que a Constituição Federal tem como princípio fundamental a dignidade da pessoa humana e assegura a todos, indistintamente, o direito à privacidade, honra, imagem e intimidade - além da autodeterminação.

Além disso, há de se ter em mente que em nosso país há uma evidente distinção/ discriminação entre os usuários e, conforme consta do voto proferido pelo Ministro Barroso, a fixação de um critério objetivo para definir a quantidade de droga apta a caracterizar o consumo pessoal tem por finalidade também eliminar a disparidade no tratamento de casos semelhantes em diferentes contextos sociais.


STF - Tema 506 - Tipicidade do porte de droga para consumo pessoal


1) ⁠Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (artigo 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (artigo 28, III);

2) ⁠As sanções estabelecidas nos incisos I e III do artigo 28 da Lei 11.343/2006 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta;

3) Em se tratando de posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em juízo, sendo vedada a lavratura de auto de prisão em flagrante ou de termo circunstanciado;

4) Nos termos do §2º do artigo 28 da Lei 11.343/2006, será presumido usuário quem, para uso próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito;

5) A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos indicativos do intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes;

6) Nesses casos, caberá ao Delegado de Polícia consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa minudente para afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários;

7) Na hipótese de prisão por quantidades inferiores à fixada no item 4 deverá o juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante, avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio;

8) A apreensão de quantidades superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir pela atipicidade da conduta, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário.


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