Até meados de 1977, as expressões "até que a morte nos separe" e "o que Deus uniu, o homem não separa" eram muito mais do que chavões: representavam a realidade de um país cuja população era predominantemente católica e conservadora, e que via o casamento como um sacramento, uma união indissolúvel. Naquele ano, com a promulgação da Emenda Constitucional n.º 9 e posterior advento da Lei n.º 6.515, foi estabelecida a figura do divórcio, o qual, nos exatos termos do artigo 24, "põe termo ao casamento e aos efeitos civis do matrimônio religioso."
A Lei do Divórcio disciplinou a matéria e promoveu alterações no Código Civil de 1916 e Código de Processo Civil de 1973. Assim, o fim do matrimônio passava necessariamente por duas etapas distintas: enquanto a separação judicial colocava termo à sociedade conjugal, o divórcio dissolvia o vínculo matrimonial.
Até a Emenda Constitucional n.º 66/2010, havia prazos a serem observados: o casal devia provar que estava separado judicialmente há 01 (um) ano para que a separação fosse convertida em divórcio, ou separado de fato há 02 (dois) anos para a decretação do divórcio direto. Com a nova redação dada ao § 6.º do artigo 226 da Constituição Federal de 1988, atualmente "o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio", sem a necessidade de prévia separação judicial ou de fato.
Sobre o assunto, temos ainda a Lei n.º 11.441/2007, que surgiu no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de desafogar o Poder Judiciário, bem como agilizar a realização de procedimentos mais simples através da via administrativa, ou seja, por meio de escritura pública a ser lavrada em Tabelionato - caso da Separação, Divórcio e Partilha Extrajudicial , tema sobre o qual já escrevemos aqui no blog (clique no link).
Em 2019, uma nova modalidade de divórcio surgiu e vem se firmando em nossos Tribunais: o divórcio liminar unilateral ou impositivo. Ao conceder pedido de urgência formulado por uma das partes, o Magistrado decreta a dissolução do vínculo matrimonial antes da manifestação do outro cônjuge (ou até mesmo de sua citação no processo), em sede de tutela antecipada.
Embora o Código de Processo Civil de 2015 nada diga a respeito, os Juízes têm aplicado as disposições referentes à tutela provisória de evidência - por se tratar de direito potestativo e incondicional, bastando a manifestação de vontade inequívoca da parte, sendo dispensável o contraditório. Assim:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
(...)
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
(...)
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Em razão da pandemia do coronavírus, estima-se que o número de divórcios aumente consideravelmente, face a necessidade de convivência maior do casal por conta do isolamento social. Sozinhos e confinados, acabam aflorando os conflitos e as diferenças se tornam gritantes, podendo a coabitação chegar ao ponto de se mostrar insustentável. Há de se atentar também para a relação entre Distanciamento Social e Violência Doméstica (clique no link).
Além de ser perfeitamente aplicável às situações de agressão contra a mulher - em que a separação se mostra urgente e necessária -, a decretação do divórcio liminar unilateral também cabe nos casos em que uma das partes se nega a encerrar o vínculo formalmente - muitas vezes por pura e simples implicância, ou se encontra em local incerto/ não sabido, gerando transtornos àquele(a) que pretende seguir a vida sozinho ou com um novo cônjuge/ companheiro.
O casamento, que até o final dos anos 70 tinha ares de imutabilidade, em que não raro os cônjuges sujeitavam-se a uma vida de infelicidade, fadados ao sofrimento perpétuo em face da proibição de rompimento do vínculo, hoje tem como única "amarra" os laços de AMOR. Assim, nos dias atuais a longevidade do matrimônio está intimamente ligada à ideia de construção, manutenção e fortalecimento das conexões de afeto.
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