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quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Hipóteses de Exclusão de Herdeiro

"-EU VOU TE DESERDAR!" 

Quantas vezes já não ouvimos essa frase em tom de brincadeira (ou não) dos pais quando o(a) filho(a) faz ou diz algo que eles não aprovam? Mas será que basta uma simples discordância de ideias para que um herdeiro seja excluído da sucessão ou é necessária a prática de um ato grave, apto a configurar indignidade ou deserdação?

A resposta está no Direito das Sucessões - artigo 1.814 do Código Civil:


Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I - que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.


O direito à herança está expressamente previsto no artigo 5.º, inciso XXX da Constituição Federal de 1988 - trata-se, portanto, de garantia fundamental. Assim, para que o herdeiro ou legatário seja excluído da sucessão, é necessário o cometimento de crime grave ou ato reprovável, de desprezo/desrespeito por aquele que sucederia o(a) falecido(a), apto a ensejar o rompimento dos laços afetivos - amor, carinho, respeito, cumplicidade, solidariedade. E aqui cumpre dizer que a afetividade é o princípio central do Direito das Famílias, decorrente de outro importantíssimo: o da dignidade da pessoa humana. 

Importante ressaltar que a exclusão do herdeiro em quaisquer dos casos de indignidade acima mencionados será declarada por sentença judicial. O rol de comportamentos indignos é taxativo, ou seja, não admite extensão e/ou interpretação.

Mas será possível afastar um herdeiro ou legatário da sucessão por testamento? SIM, desde que a causa seja expressamente declarada no referido documento. Conforme artigo 1.961 e seguintes do Código Civil, que tratam sobre a sucessão testamentária:


Art. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão.

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

I - ofensa física;

II - injúria grave;

III - relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;

IV - desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos ascendentes pelos descendentes:

I - ofensa física;

II - injúria grave;

III - relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta;

IV - desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.


Conforme elucidativo trecho constante da recente decisão exarada pelo Ministro Marco Buzzi nos autos do Recurso Especial n.º 1.921.946, no tocante à distinção entre indignidade e deserdação:

A exclusão da sucessão por indignidade, prevista nas hipóteses elencadas taxativamente no art. 1.814 do CC, não se confunde com a deserdação, regulada pelo art. 1.961 e seguintes do mesmo diploma legal, cujo ato é privativo do autor da herança, em testamento, com expressa declaração da causa (art.1.962 do CC).

3. Suscitada uma causa que autoriza a deserdação do descendente por ascendente, prevista no art. 1.962, IV, do CC, não se admite o pedido, sob o mesmo fundamento, de declaração de indignidade de herdeiro, cujas hipóteses estão previstas no rol taxativo e restritivo do art. 1.814 do CC.

Por fim, cabe uma reflexão. Aspecto que vem sendo alvo de debates diz respeito ao inciso IV do artigo 1.962 supracitado. Embora a norma legal trate do desamparo de pai/ mãe/ avós em alienação mental ou grave enfermidade, por vezes ocorrem situações de evidente desamparo material (dever de cuidado e assistência), afetivo e espiritual dos ascendentes. Estariam essas hipóteses de conduta lesiva (e por vezes desumana) excluídas ou são passíveis de arguição em casos de deserdação?


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