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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Boas Festas II

Em virtude do período de recesso e férias forenses (20/12 a 20/01/2014), a blogueira que vos escreve dará uma pausa nos posts semanais, para voltar em 2014 cheia de gás e novos artigos jurídicos sobre temas polêmicos e interessantes. 

Desejo a todos que nos acompanham um Natal com muita paz, amor e saúde, na presença do Senhor, e um Ano Novo repleto de alegrias, conquistas e realização de projetos e sonhos.

Que nossa fé e esperança se renovem e 2014 seja um ano especial e iluminado para todos nós!

Boas Festas!

domingo, 15 de dezembro de 2013

Isenção de Tarifas em Conta-Salário

A abertura de conta-salário pelas empresas da iniciativa privada para fins de execução da folha de pagamento de seus funcionários via instituição financeira passou a ser obrigatória em 02/01/2009. Já para os servidores e empregados públicos a adoção desse sistema tornou-se compulsória a partir de 02/01/2012. Antes disso, o pagamento dos salários podia ser realizado mediante depósito em contas bancárias comuns. 

Conforme definição do Banco Central do Brasil (BACEN), conta-salário

é um tipo especial de conta de registro e controle de fluxo de recursos, destinada a receber salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias, pensões e similares. A "conta-salário" não admite outro tipo de depósito além dos créditos da entidade pagadora e não é movimentável por cheques.

Por ser um tipo de conta bancária destinada unicamente a RECEBER os vencimentos, não é possível a cobrança das seguintes tarifas:

Sobre esse tipo de conta é vedada a cobrança de tarifa nas transferências dos recursos para outra instituição financeira, para crédito à conta de depósito de titularidade do beneficiário, conjunta ou não, desde que esses valores sejam transferidos pelo valor total creditado, admitida a dedução de parcelas de empréstimo, de financiamento ou de arrendamento mercantil, contratados na "conta-salário".

Na transferência parcial do crédito para outra instituição financeira pode ser cobrada tarifa, mesmo que seja uma só transferência.

Se a transferência for para outra conta na mesma instituição financeira, é vedada a cobrança de tarifa nas transferências pelo valor total ou parcial dos créditos.

Da mesma forma não podem ser cobradas tarifas por:

* fornecimento de cartão magnético, a não ser nos casos de pedidos de reposição decorrentes de perda, roubo, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição financeira;

* realização de até cinco saques, por evento de crédito;

* acesso a pelo menos duas consultas mensais ao saldo nos terminais de auto-atendimento ou diretamente no guichê de caixa;

* fornecimento, por meio dos terminais de auto-atendimento ou diretamente no guichê de caixa, de pelo menos dois extratos contendo toda a movimentação da conta nos últimos trinta dias;

* manutenção da conta, inclusive no caso de não haver movimentação.

Na hipótese da instituição bancária efetuar descontos indevidos na conta-salário (tais como as cestas de serviços), é possível ingressar com ação judicial requerendo a devolução em dobro das quantias debitadas, com base no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a relação de consumo existente entre as partes.

Ademais, além dos danos materiais causados ao titular da conta-salário, o banco poderá ser condenado ao pagamento de uma indenização pela quebra da boa-fé objetiva e seus deveres anexos, tais como o de informação, transparência, lealdade, cooperação e clareza. Inclusive porque, em havendo falha na prestação do serviço, a instituição responde objetivamente (artigo 14 do CDC).

sábado, 7 de dezembro de 2013

Dano Moral via Facebook

Publicar, curtir, comentar, compartilhar: palavras bastante conhecidas por quem transita nas redes sociais, visita perfis e lê postagens no mural de familiares, amigos, colegas e até mesmo de pessoas estranhas. Embora o objeto de nossas maiores atenções sejam as notícias e artigos que nos deixam felizes, não raro nos deparamos com posts que causam raiva, indignação e revolta, especialmente quando envolvem violação de direitos humanos e maus tratos a animais. Para além de gerar comentários, muitas vezes tais mensagens ensejam compartilhamentos (dezenas, centenas, milhares até), porém nem sempre correspondem à verdade... surge então o dever de indenizar o ofendido.

Na semana que passou, decisão importante em relação ao tema foi proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, oportunidade em que duas mulheres foram condenadas ao pagamento de R$ 20 mil a título de danos morais a um veterinário, em razão de uma publicação contendo a narrativa de fatos não devidamente comprovados e que acabou sendo compartilhada no Facebook.

Em síntese, uma das mulheres publicou a foto de um animal de estimação em precário estado de saúde após cirurgia de castração realizada pelo veterinário em questão. Além da imagem, redigiu um texto imputando ao profissional a responsabilidade pela situação, acusando-o de negligência quanto ao trato da cachorrinha. Por seu turno, a outra mulher curtiu e compartilhou o post, baseada apenas nas suposições da amiga.

Por ocasião do julgamento do recurso, irretocável o voto do relator, Desembargador José Roberto Neves Amorim, ao asseverar que

“se por um lado o meio eletrônico tornou mais simples a comunicação entre as pessoas, facilitando também a emissão de opinião, sendo forte ferramenta para debates em nossa sociedade e denúncias de inúmeras injustiças que vemos em nosso dia-a-dia, por outro lado, trouxe também, a divulgação desenfreada de mensagens que não condizem com a realidade e atingem um número incontável de pessoas, além da manifestação precipitada e equivocada sobre os fatos, dificultando o direito de resposta e reparação do dano causado aos envolvidos”.

Não é demais lembrar que a Internet, por seu intenso tráfego de informações e facilidade de acesso aos dados ali expostos, os quais repercutem quase que instantaneamente - mormente em casos como o narrado, cuja gravidade da acusação é apta a causar comoção popular - possui um poder altamente destrutivo. Portanto, há de se ter cuidado com o que postamos, comentamos, curtimos e compartilhamos na rede, pois imputar um fato gravoso a alguém, especialmente em um momento de ímpeto e sem qualquer prova do alegado, pode causar danos imensos e até mesmo destruir uma carreira, por irresponsabilidade de quem publica e de quem replica, eis que a divulgação pode aumentar a visibilidade (e os prejuízos ao direito de personalidade do acusado) de forma exponencial.


Apelação nº 4000515-21.2013.8.26.0451 (TJSP)

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Direito à Vida x Direito à Morte

A Constituição Federal de 1988 dispõe, no caput de seu artigo 5.º, que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)" Ademais, prevê expressamente em seu artigo 1.º, inciso III, tratar-se de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil "a dignidade da pessoa humana."

Por outro lado, o Código Civil de 2002, em seu artigo 15, dispõe que "ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica."

Da leitura dos dispositivos legais acima transcritos, temos que o direito à vida e à dignidade humana, embora protegidos pelo nosso ordenamento pátrio, pode ser relativizado quando o indivíduo titular desses direitos assim o quiser.

Nesse sentido é a novel decisão oriunda da 1.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que negou provimento a recurso manejado pelo Ministério Público Estadual, o qual visava obter uma autorização judicial para suprir a vontade de um cidadão idoso que se recusou a realizar uma cirurgia para amputação de um dos pés que se encontrava necrosado, o que poderia acarretar em uma infecção generalizada e por consequência seu óbito.

No caso concreto, o TJRS confirmou a sentença prolatada pelo Magistrado de primeira instância, no sentido de que não pode o Estado interferir na vontade expressamente manifestada por um paciente - de morrer com dignidade - obrigando-o a submeter-se a procedimento cirúrgico sem a sua vontade e consentimento, ainda que tal providência seja fundamental para a manutenção de sua vida.

Nesse sentido é a ementa do julgado:


APELAÇÃO CÍVEL. ASSISTÊNCIA À SAÚDE. BIODIREITO. ORTOTANÁSIA. TESTAMENTO VITAL. 1. Se o paciente, com o pé esquerdo necrosado, se nega à amputação, preferindo, conforme laudo psicológico, morrer para "aliviar o sofrimento"; e, conforme laudo psiquiátrico, se encontra em pleno gozo das faculdades mentais, o Estado não pode invadir seu corpo e realizar a cirurgia mutilatória contra a sua vontade, mesmo que seja pelo motivo nobre de salvar sua vida. 2. O caso se insere no denominado biodireito, na dimensão da ortotanásia, que vem a ser a morte no seu devido tempo, sem prolongar a vida por meios artificiais, ou além do que seria o processo natural. 3. O direito à vida garantido no art. 5º, caput, deve ser combinado com o princípio da dignidade da pessoa, previsto no art. 2º, III, ambos da CF, isto é, vida com dignidade ou razoável qualidade. A Constituição institui o direito à vida, não o dever à vida, razão pela qual não se admite que o paciente seja obrigado a se submeter a tratamento ou cirurgia, máxime quando mutilatória. Ademais, na esfera infraconstitucional, o fato de o art. 15 do CC proibir tratamento médico ou intervenção cirúrgica quando há risco de vida, não quer dizer que, não havendo risco, ou mesmo quando para salvar a vida, a pessoa pode ser constrangida a tal. 4. Nas circunstâncias, a fim de preservar o médico de eventual acusação de terceiros, tem-se que o paciente, pelo quanto consta nos autos, fez o denominado testamento vital, que figura na Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina. 5. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70054988266, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 20/11/2013).

Importante dizer que o idoso de 79 anos de idade estava completamente lúcido e consciente de sua decisão, em pleno gozo de suas faculdades mentais, conforme laudo médico psiquiátrico realizado. Assim, em sendo escolha do paciente submeter-se à ortotanásia (não prolongação da vida por meios artificiais), cabe aos médicos respeitar a opção desejada. Referido tema, inclusive, já foi objeto de artigo publicado no blog em dezembro de 2010 (http://cintiadv.blogspot.com.br/2010/12/ortotanasia-x-eutanasia.html)

Aplicável, assim, o quanto contido na Resolução n.º 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, no que tange ao denominado "testamento vital", cujos pressupostos para a validade do ato extraímos de trecho da decisão do TJRS:

Tal manifestação de vontade, que vem sendo chamada de TESTAMENTO VITAL, figura na Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, na qual consta que “Não se justifica prolongar um sofrimento desnecessário, em detrimento à qualidade de vida do ser humano” e prevê, então, a possibilidade de a pessoa se manifestar a respeito, mediante três requisitos: (1) a decisão do paciente deve ser feita antecipadamente, isto é, antes da fase crítica; (2) o paciente deve estar plenamente consciente; e (3) deve constar que a sua manifestação de vontade deve prevalecer sobre a vontade dos parentes e dos médicos que o assistem.

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Resolução n.º 1995/2012 em sua íntegra:

http://www.bioetica.ufrgs.br/1995_2012.pdf

sábado, 23 de novembro de 2013

Plano de Saúde e Reajuste por Aumento de Sinistralidade

Os contratos de plano de saúde coletivos/ empresariais prevêem, em regra, o reajuste no valor das mensalidades (atualização) em três situações distintas: a) com base na variação dos custos e serviços ocorrida nos últimos 12 (doze) meses; b) em face da alteração do nível de sinistralidade (reavaliação dos custos nos últimos 12 meses); c) por ocasião da mudança da faixa etária (consoante tabela estabelecida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar -ANS).

O aumento da sinistralidade diz respeito ao desequilíbrio econômico-financeiro causado pelo uso excessivo das benesses do contrato por parte do grupo de beneficiários (receitas < despesas), o que, em alguns casos, pode gerar a rescisão da avença por impossibilidade de sua manutenção, face a onerosidade excessiva imputada à Operadora do plano de saúde. É de salientar que tal hipótese somente poderá ocorrer em se tratando de plano coletivo (logo, envolvendo duas empresas), bem como a possibilidade de cancelamento deverá estar necessariamente prevista em cláusula contratual, a qual disporá ainda sobre o período de aviso prévio.

Importante dizer que, assim como outras modalidades de contratos, os que versam sobre plano de saúde possuem como características a onerosidade e a comutatividade, ou seja, envolvem o dever de prestação (serviços) e contraprestação (pagamento). O valor inicial das parcelas dos planos coletivos é calculado com base em dados genéricos e técnicas atuariais - análise do número de integrantes, idade, doenças e lesões preexistentes - donde se extrai um quantum estimativo. Somente no decorrer da contratação é que se terá uma noção do histórico clínico da carteira de beneficiários, quando o plano então buscará uma readequação do valor das parcelas para fins de restabelecer o equilíbrio/ equivalência nas prestações.

Todavia, recentemente o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao analisar recurso que versa sobre a matéria, entendeu pela NULIDADE da cláusula contratual do plano de saúde que prevê a possibilidade de reajuste do valor da mensalidade com base na sinistralidade. Nos termos do acórdão proferido pela Sexta Câmara Cível, não é dado ao fornecedor do serviço aplicar o reajuste de modo unilateral, o que configuraria abusividade, já que existe a possibilidade de manipulação dos dados por parte da empresa, através da criação de despesas.

No caso concreto, a Operadora foi condenada a devolver, na forma simples, os valores indevidamente cobrados a maior desde 2011.


EMENTA DO JULGADO:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DE MENSALIDADE EM RAZÃO DA SINISTRALIDADE. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO SIMPLES. PRESCRIÇÃO TRIENAL. REAJUSTE ANUAL CONFORME O CONTRATADO. POSSIBILIDADE. Trata-se de ação de revisão de contrato de plano de saúde, na qual a parte autora objetiva a declaração de nulidade das cláusulas contratuais que prevêem reajustes abusivos nas mensalidades, julgada improcedente na origem. REAJUSTE ANUAL - No que guarda relação com o reajuste anual, viável a livre negociação do índice entre as partes, uma vez que inexiste interferência da ANS no cômputo do reajuste anual dos contratos coletivos, assim como inexiste desigualdade na relação jurídica a ponto de nulificar a cláusula contratual que estipula o índice, eis que, nesses casos, o consumidor possui maior poder de negociação. O papel da autarquia reguladora nos contratos de plano de saúde entabulados coletivamente consubstancia-se apenas em monitorar os índices praticados pela operadora, de forma que o reajuste deve ser previamente comunicado à ANS, não obstando a livre negociação do reajuste entre as partes, desde que não ultrapassem àqueles previstos contratualmente e não se configurem manifestamente abusivos. REAJUSTE POR SINISTRALIDADE - A prática de reajustes com base na planilha de custos e desempenho, ou seja, na sinistralidade, vai de encontro às disposições do Código de Defesa do Consumidor, mormente porque essa condição, além de impedir o conveniado de ter, no ato da contratação, a noção exata de quais serão os seus ônus, também possibilita a manipulação dos dados pela operadora, de modo a forçar a majoração artificial de preços, em clara ofensa ao artigo 51, inciso X e § 1º, e incisos I e II, do CDC. Embora haja a possibilidade de a operadora reajustar os valores dos prêmios mensais, deve-se reconhecer a abusividade em conferir ao fornecedor o poder de apreciar unilateralmente a majoração a ser aplicada, tal como ocorre quando do aumento das mensalidades em razão da sinistralidade. Aplicação da regra disciplinada pela Instrução Normativa nº 49 da ANS, de 17/05/2012. Precedentes. REPETIÇÃO DOS VALORES - É possível a repetição do indébito de forma simples, em atenção ao princípio que veda o enriquecimento indevido do credor. Precedentes. PRESCRIÇÃO - A matéria relativa ao prazo prescricional das parcelas que devem ser restituídas por indevidas, nas ações como a "sub judice", restou sedimentada neste órgão fracionário como sendo trienal "ex vi legis" do art. 206, §3º do CC/2002. Precedentes. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70056483696, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 24/10/2013). GRIFO NOSSO.
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Código de Defesa do Consumidor:

Artigo 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...)
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;

§ 1.º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.


Instrução Normativa n.º 49 da ANS:

Art. 5.º- É vedada cláusula de reajuste baseada em:
I - formas de reajuste condicionadas à sinistralidade da operadora;

sábado, 9 de novembro de 2013

CDC e a Cobrança Indevida de Tarifas nas Faturas do Cartão de Crédito

Não são raros os casos de consumidores que, ao receberem a fatura mensal do cartão de crédito, são surpreendidos pela cobrança de tarifas cuja origem desconhecem e que nem sempre são objeto de questionamento junto à operadora.

Uma dessas rubricas é a "AVAL. EMERG. CREDITO" (avaliação de viabilidade e de riscos para a concessão de crédito em caráter emergencial), que em outras palavras se trata de uma tarifa cobrada com o intuito de promover a ampliação do crédito para o consumidor, sempre que este ultrapassar o limite do cartão, a qual poderá ser cobrada uma vez a cada 30 (trinta) dias.

Ocorre que referida ampliação do crédito - com a consequente cobrança de tarifa - somente poderá ser concedida a pedido do cliente, nos termos da Resolução n.º 3.919/2010 do BACEN (Banco Central do Brasil), que assim determina:
 
Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.
 
 Segundo as normas comuns aplicadas a todas as operadoras que atuam no mercado, o consumidor só poderá utilizar seu cartão de crédito até o limite que lhe foi previamente disponibilizado. Em sendo ultrapassado este limite, o procedimento correto é de negar sua utilização, SALVO, como já referimos, pedido expresso do cliente à instituição financeira no sentido de autorizar a realização de operações acima do limite do cartão, com a consequente cobrança de tarifa.

Na prática, porém, o que se vê é a disponibilização de crédito e cobrança de tarifas sem a solicitação, e muitas vezes sem nem mesmo o conhecimento do cliente, em completa contrariedade ao que determina o Código de Defesa do Consumidor, especialmente no que diz respeito ao direito à informação (artigo 6.º, inciso III da Lei n.º 8.078/90).

Ademais, tal conduta pode ser classificada como ABUSIVA, uma vez que é expressamente vedada pelo CDC em seu artigo 39. Vejamos:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
(...)
III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;
(...)
Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.

 
Aplica-se, assim, a norma contida no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Importante referir que, além do direito do cliente/ consumidor a receber em dobro os valores indevidamente inseridos em sua fatura (conforme determina o artigo 42, parágrafo único, da Lei n.º 8.078/90), poderá também postular uma indenização por dano moral, em sua modalidade in re ipsa, uma vez que os danos são presumidos em virtude da violação dos deveres anexos à boa-fé objetiva (transparência, lealdade, clareza).

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Sensacionalismo Jornalístico gera Dano Moral

Não são raros os programas de televisão apresentados por jornalistas que se excedem verbalmente quando da exposição das notícias. Todavia, recentíssima decisão oriunda do STJ confirmou o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em ação proposta contra José Luiz Datena, condenando-o a indenizar um homem chamado de "bandido" e outros adjetivos pejorativos em rede nacional, sem qualquer prova que sustentasse tal acusação.

Como é de praxe no jornalismo sensacionalista, cuja intenção primordial não é apresentar os fatos com isenção e parcialidade (com base em dados concretos), mas sim com fortes elementos de suspense na busca de maior audiência (leia-se: IBOPE), referido apresentador faltou com os deveres de cautela e razoabilidade ao imputar a prática de crimes a um homem, com descabido excesso de linguagem.

Segue trecho bastante esclarecedor recortado da decisão exarada pelo TJSP:


Acompanha-se integralmente o MM. Juiz quando assinala que: "(...) a reportagem, marcada pela falta de prudência e de cautela, despida de um mínimo de provas sobre as práticas criminosas atribuídas ao autor, é típico exemplo de mau jornalismo, que, afastando-se de sua missão institucional de informação e desvirtuando suas finalidades, descamba para o sensacionalismo, sendo exercido, assim, com o único propósito de aumentar a audiência, elevar os lucros da empresa e, no caso vertente - pior – para resolver assuntos de natureza pessoal. Daí a ilicitude das condutas dos réus, que, à luz dos interesses do autor - e, inclusive, da coletividade para quem dirigida a reportagem -, exerceram ilícita e abusivamente a liberdade de informação jornalística. Na verdade, os réus ofenderam, despropositada, desproporcional e injustificadamente, o nome, a imagem, a reputação e o sentimento de auto-estima do autor, cujos sacrifícios não se impunham em prol da tutela de bem jurídico superior, ainda mais se demonstrado que a matéria veiculada se caracterizou pela informação açodada, despreocupada e despida de seu conteúdo ético, pela leviandade, pelo descuido censurável e pelo sensacionalismo (...)." Restou evidente o dano moral, indiscutível. O autor foi apresentado em público como elemento de extrema periculosidade. O apelo de ambos os réus neste aspecto é absolutamente inócuo, nada tem de jurídico, tem o aspecto de mera literatura. É irreal. Por outro lado, pouco importa a condição do autor, apontado como possuidor de maus antecedentes e por isso de duvidosa honra, até porque estava preso à época em presídio militar (por porte ilegal de arma). Mesmo fossem muito sérios seus antecedentes, que nem de longe revelam o delinqüente apresentado na televisão, haveria ainda assim de ser poupado dos achaques. Mesmo naquela condição permaneceria senhor de direitos. Não há como defender-se a longa tese da corre sobre ausência de dolo ou de nexo causal. Seu apelo revela-se ainda mais fantasioso e irreal, nada se aproveita. É abominável, ademais, o motivo da elaboração da matéria, que não foi conseqüência de erro jornalístico, mas feita para, através do autor, atingir terceira pessoa.


Sempre bom lembrar que todos, sem exceção, são titulares de direitos fundamentais, nos termos da Constituição Federal de 1988, e o direito à reparação civil nasce sempre que a honra, o nome e a imagem forem maculados, especialmente em casos de abuso jornalístico como o acima relatado, em que o direito de informar a população foi completamente desvirtuado.

AREsp 302557/SP

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

STF decide: O prazo para a Revisão de Benefícios do INSS é de 10 (dez) anos

Na semana que passou, os Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiram, por unanimidade, que o prazo para segurados do INSS requererem a revisão judicial de seus benefícios é de 10 (dez anos). Tal limitação temporal não apenas confirma decisões anteriores proferidas acerca do tema, que acolheram o prazo decadencial, como também será aplicada a todas as demandas semelhantes que atualmente tramitam contra a Previdência Social nas instâncias inferiores, em face do reconhecimento da repercussão geral da matéria. 

Importante dizer que, antes do ingresso da Medida Provisória n.º 1.523-9/1997 no ordenamento jurídico brasileiro, a qual instituiu o prazo decadencial (MP posteriormente convertida na Lei n.º 9.528/97), inexistia prazo para que os segurados postulassem a revisão do ato de concessão de seus benefícios. Com a entrada em vigor da norma, o prazo de 10 (dez) anos passou a ser aplicado somente para os benefícios concedidos após 1997, não cabendo aos anteriores, já que a Lei da Previdência (Lei n.º 8.213/91) nada dispunha acerca do tópico. Logo, para os benefícios anteriores a 1997, não havia prazo para propor ação de revisão, inclusive porque a norma de direito material não poderia surtir efeitos retroativos.

Neste momento, todavia, até mesmo os benefícios concedidos antes de 1997 serão atingidos pela norma do artigo 103 (salienta-se que o prazo decenal de revisão é contado a partir da vigência da Medida Provisória, e não da data da concessão do benefício). Nos termos do mencionado artigo:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

Segundo o Relator do recurso no STF, Ministro Luiz Roberto Barroso, não há que se falar em direito adquirido dos segurados que tiveram seus benefícios concedidos antes de 1997 a um futuro pedido de revisão do benefício, que poderá nunca ocorrer. No tocante ao benefício em si, aduziu que este constitui direito fundamental do cidadão, razão pela qual inexiste prazo para o seu requerimento. Assim, em seu voto asseverou que o prazo previsto na Lei n.º 9.528/97 não é inconstitucional, e somente atinge a pretensão de discutir o valor do benefício já concedido, tendo como fundamento a segurança jurídica e a "manutenção do equilíbrio atuarial do sistema previdenciário".

Recurso Extraordinário 626.489/SE
 

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Responsabilidade do Blogueiro

Ao tratarmos acerca do tema "direitos fundamentais" em posts anteriores do blog, vimos que, a rigor, não existe supremacia de uns sobre outros, eis que todos eles encontram-se em um mesmo patamar de importância. Todavia, sempre que ocorrer uma colisão entre dois ou mais direitos, deverá ser realizada uma análise ponderada do caso concreto pelo Magistrado para fins de averiguar qual prevalecerá.

Recentemente, um blogueiro foi condenado judicialmente em razão de comentário escrito por um de seus leitores em artigo publicado na internet. No ocasião, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu que, no conflito liberdade de imprensa x honra do ofendido, esta se sobrepõe, pelo que o blogueiro foi condenado a indenizar um servidor público na quantia de R$ 10 mil por danos morais.

Interessante referir que a origem da demanda não foi a matéria em si, mas o comentário publicado por terceiro, com intuito claramente ofensivo à pessoa do trabalhador (em sua vida privada, honra, moral e imagem), o que evidentemente extrapola o direito à livre manifestação de pensamento, assegurada constitucionalmente. Não é demais lembrar que a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do estado democrático de direito, representando a base do nosso ordenamento jurídico.

Diante dessa decisão, é preciso termos muita atenção com o conteúdo postado em nossas páginas. Cabe a nós, blogueiros, controlar/moderar os comentários que são enviados pelos leitores (tentar evitar os anônimos), sob pena de respondermos civilmente por eventuais excessos de linguagem cometidos, em face da negligência quanto à necessária prévia análise do teor submetido à publicação.







sábado, 5 de outubro de 2013

Constituição Federal - 25 anos

"Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL."

Estas palavras correspondem ao preâmbulo da nossa Carta Magna. O topo do ordenamento jurídico pátrio. A Lei Fundamental. 

Em 05 de outubro de 1988, Ulysses Guimarães, então Presidente do Congresso Nacional, declarou promulgada aquela que seria a Lei das Leis: depois de longos anos de ditadura militar, surge no país a Constituição Cidadã, comprometida com os valores democráticos.

25 anos se passaram desde então e a nossa CF/88 passou por várias transformações, mormente originárias das emendas constitucionais apresentadas, e que hoje somam 74 (a mais recente data de 06/08/2013, e versa sobre a alteração do artigo 134, inserindo um § 3.º à sua redação original).

Da mesma forma, a partir da promulgação da Carta Magna de 1988 um fenômeno se estabeleceu: as normas oriundas dos demais ramos do Direito passaram a ser interpretadas sob um viés constitucional, levando em conta especialmente os Direitos Fundamentais.

Estes, que já foram objeto de 03 post's no blog - "Os Direitos Fundamentais" ( http://cintiadv.blogspot.com.br/2010/10/os-direitos-fundamentais.html ), "Os Direitos Fundamentais - II" ( http://cintiadv.blogspot.com.br/2010/10/os-direitos-fundamentais-ii.html ) e "Os Direitos Fundamentais - III" ( http://cintiadv.blogspot.com.br/2010/10/os-direitos-fundamentais-iii.html ), configuram o coração da CF/88, dada a sua importância. São direitos e garantias inerentes a todos do povo, sem distinção, e cuja principal função é assegurar o respeito ao princípio da dignidade humana.

Neste 05/10/2013, há muitos avanços a se comemorar e outros tantos a aguardar. Se alguns dispositivos legais ainda necessitam ser regulamentados, outros tantos precisam apenas ser efetivados. No que diz respeito aos direitos fundamentais, cabe a cada um de nós, operadores do Direito, buscar a sua integral implementação, sempre visando a construção de uma sociedade livre, justa e igualitária, conforme objetiva a nossa Carta Maior (art. 3.º, inciso I, da CF/88).

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Constituição da República Federativa do Brasil:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm 

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Direito de Vizinhança e Tolerância

Lendo recentes decisões sobre assuntos jurídicos, chamou-me a atenção um julgado que trata acerca do tema "direito de vizinhança". A discussão central diz respeito à extensão, a seu acompanhante, do direito de servidão de passagem concedido judicialmente (em demanda pretérita) a uma senhora com idade avançada e portadora de problemas de saúde.

Ao tratar sobre passagem forçada, o Código Civil de 2002 assim prevê:

Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário.
§ 1o Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem.

No caso em tela, a idosa ajuizou ação visando a passagem forçada no terreno do vizinho. Importante dizer que para a concessão da servidão, a lei determina que  o imóvel da pessoa que requer o benefício seja "encravado" (não possui saída para a via pública ou que para promover sua abertura seja necessário despender um valor bastante elevado).

Muito embora o terreno da Autora não se enquadrasse no conceito de encravado, o Judiciário deferiu a servidão de passagem gratuita à idosa por razões humanitárias, em face de seu delicado estado de saúde, eis que seu imóvel não oferecia as melhores condições para a sua locomoção e a melhor alternativa era a passagem pelo imóvel lindeiro, cujo acesso vinha sendo obstaculizado pelo vizinho.

Não obstante a decisão que lhe foi favorável tenha transitado em julgado (ou seja, não mais passível de recurso), tempos depois o vizinho passou a impedir o cônjuge da idosa a transitar em seu terreno. Uma vez que este não foi beneficiado pela primeira demanda (ajuizada apenas em nome da esposa), o mesmo teve que ingressar com nova ação para assegurar o direito de acompanhá-la, já que a idosa não podia mover-se sozinha.

Tal qual a demanda anterior, esta também obteve decisão favorável do Poder Judiciário, tendo o STJ proferido a decisão final acerca da controvérsia. Do acórdão de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, destacamos o seguinte trecho:


Ora, em situações excepcionais, o julgador deve mesmo se desgarrar das amarras estreitas do formalismo jurídico, não para se utilizar de arbitrariedade, mas para dar humanismo à letra fria da lei. Essa é tipicamente uma dessas situações, em que somos surpreendidos pela perplexidade de alcançar a Corte Superior um processo em que se discute essencialmente desentendimentos entre vizinhos, em especial quando se envolve questões humanitárias que deveriam despertar sentimentos de compaixão e solidariedade.

 

É mais que razoável, é esperado que uma pessoa adoentada, portadora de “hérnia de grandes proporções” , não transite desacompanhada. E é absolutamente irracional a pretensão de que ela transite pela passagem sozinha, judicialmente garantida para facilitar-lhe o acesso e a locomoção, enquanto seu cônjuge ou qualquer outra pessoa que a acompanhe deva utilizar o caminho regular.

Sob essa ótica, causa perplexidade a utilização do Estado-Juiz para a busca de vendeta pessoal, completamente desgarrada de proveito jurídico, ou quiçá econômico, pois a restrição de acesso aos acompanhantes da favorecida pela servidão de uso, não objetiva fim juridicamente sólido.

Questionável, inclusive, a própria resistência inicial da parte à utilização da passagem pela companheira do recorrido, pois demonstra inaceitável desconsideração com os mais comezinhos princípios que regem as relações sociais, dos quais se deveria extrair a sobriedade necessária para a composição e, porventura, para a mera aquiescência do pleito inicial de trânsito, por reconhecido motivo de doença, pela propriedade do recorrente.

Assim como em todas as relações existentes em sociedade, aquelas havidas entre vizinhos também devem ser permeadas pelos princípios da solidariedade e da dignidade humana. Tolerância, aceitação, cooperação, humanidade e compaixão são características que devem ser cultivadas e aperfeiçoadas para a melhor convivência entre as pessoas, especialmente quando a proximidade é tamanha.  

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Recurso Especial n.º 1.370.210 - RJ


sexta-feira, 20 de setembro de 2013

20 de Setembro: o Precursor da Liberdade IV

  Hino do Rio Grande do Sul   


  Como aurora precursora  
  Do farol da divindade         
  Foi o 20 de Setembro         
  O precursor da liberdade 
  Mostremos valor constância
  Nesta ímpia e injusta guerra
  Sirvam nossas façanhas         
  De modelo a toda Terra          

  De modelo a toda Terra
  Sirvam nossas façanhas
  De modelo a toda Terra 


  Mas não basta pra ser livre  
  Ser forte, aguerrido e bravo 
  Povo que não tem virtude  
  Acaba por ser escravo          

  Mostremos valor constância 
  Nesta ímpia e injusta guerra
  Sirvam nossas façanhas      
  De modelo a toda Terra          

  De modelo a toda Terra 
  Sirvam nossas façanhas
  De modelo a toda Terra  


terça-feira, 10 de setembro de 2013

Cheque Pré-Datado e Dano Moral

O cheque "pré-datado" (cuja nomenclatura correta é "pós-datado") trata-se de uma prática comercial amplamente aceita e utilizada no mercado de consumo, visando a ampliação do prazo de pagamento, com ou sem parcelamento da dívida. Desse modo, por meio de um acordo de vontades (que pode ser verbal ou escrito) o credor se compromete  a descontar (debitar) o cheque somente na data futura informada no título. Caso apresente antes, corre o risco de ser condenado a indenizar o emitente por danos morais.

Isso porque nos termos do Enunciado de Súmula n.º 370 do STJ, "caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado."

Muito embora o cheque seja uma ordem de pagamento à vista, conforme definição legal, referido verbete emanado do Superior Tribunal de Justiça tem como objetivo manter íntegro o ajuste firmado entre as partes, protegendo assim a boa-fé que deve reger todos os negócios jurídicos, bem como seus deveres anexos (confiança, solidariedade, lealdade, segurança). 

A apresentação do cheque antes da data combinada poderá trazer severos prejuízos ao emitente, como ocorre no caso de a conta bancária não estar coberta naquele dia (insuficiência de numerário). É possível que o título seja levado a  protesto e/ou inscrito o nome do emitente perante os órgãos de proteção ao crédito, fazendo com que recaia sobre ele a pecha de inadimplente (o popular "mau pagador"), maculando assim a sua credibilidade e bom nome em razão do cheque (momentaneamente) sem fundos.

Importante dizer que se trata de dano moral puro (in re ipsa), ou seja, independe de demonstração da efetiva lesão aos atributos da personalidade do emitente do cheque, eis que referidos danos são presumíveis. Além disso, os transtornos gerados pela apresentação prematura do título são totalmente evitáveis, bastando a atenção do credor para não debitá-lo antes da data anteriormente combinada com o devedor.

Neste sentido são as recentes decisões oriundas do Tribunal de Justiça do RS:


APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. JULGAMENTO COM FUNDAMENTO NO ART. 557, § 1º - A, CPC. APRESENTAÇÃO ANTECIPADA DE CHEQUE PÓS-DATADO. DANO MORAL. SÚMULA 370 DO STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS. A apresentação antecipada de cheque pós-datado causa danos morais. Súmula 370 do STJ. Valor da condenação fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como à luz dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, além da natureza jurídica da condenação. Precedentes jurisprudenciais. RECURSO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70054554407, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 19/08/2013).


APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CHEQUES PRÉ-DATADOS APRESENTADOS ANTECIPADAMENTE. DANO MORAL CONFIGURADO. 1. Danos morais: conquanto não mais se discuta a possibilidade de a pessoa jurídica sofrer tal espécie de dano, nos termos da Súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça, cumpre registrar que o prejuízo extrapatrimonial por ela experimentado difere daquele que atinge a pessoa natural. Isto porque a pessoa jurídica, embora não seja titular de honra subjetiva, a qual se caracteriza pelo sentimento de dignidade, decoro, auto-estima, possui o que se convencionou denominar de honra objetiva, que se traduz, por exemplo, em ofensa a sua credibilidade, reputação, bom nome ou conceito no mercado. Logo, há dano quando violados tais atributos. Configura dano moral, na modalidade "in re ipsa", nos termos da Súmula n.º 370 do STJ, a apresentação de cheques antecipadamente à data acordada. 2. Quantum: na fixação do montante indenizatório por gravames morais, deve-se buscar atender à duplicidade de fins a que a indenização se presta, atentando para a capacidade do agente causador do dano, amoldando-se a condenação de modo que as finalidades de reparar a vítima e punir o infrator (caráter pedagógico) sejam atingidas. No caso em pauta, é de ser reduzida a indenização por dano moral para o montante de R$8.000,00, montante que se ajusta ao caso concreto e circunscreve-se ao pedido inicial. Apelo parcialmente provido. (Apelação Cível Nº 70038469375, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 06/06/2013).


RESPONSABILIDADE CIVIL. CHEQUE PRÉ-DATADO. APRESENTAÇÃO ANTECIPADA. DEVER DE INDENIZAR. DANO MORAL CONFIGURADO. Hipótese em que o demandado apresentou para desconto bancário cheque pré-datado antes do termo ajustado. A negligência do réu ao apresentar o cheque antes da data aprazada, além de descumprir acordo entabulado, causou danos ao autor, configurando ato ilícito passível de reparação. Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado. Inteligência da Súmula 370 do STJ. Manutenção do montante indenizatório considerando o equívoco do réu, o aborrecimento e o transtorno sofridos pelo demandante, além do caráter punitivo-compensatório da reparação (R$ 2.000,00). VERBA SUCUMBENCIAL MANTIDA. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO DESPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70054150347, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 23/05/2013). (GRIFOS NOSSOS)

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Inscrição de Dívidas no SPC/Serasa

Muitos consumidores não sabem, mas o prazo máximo de inscrição do nome do devedor em cadastros restritivos de crédito (SPC/Serasa) em virtude do não pagamento de dívidas é de 5 (cinco) anos, a contar da data em que o nome do consumidor inadimplente foi inserido nos sistemas acima mencionados. Assim informa o Código de Defesa do Consumidor:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
§ 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.


Questão diversa é o prazo prescricional para cobrança judicial de dívidas, que pode variar de acordo com o título representativo do débito, prazo este que passa a contar do dia do vencimento (data em que a dívida deveria ter sido paga e não o foi).

Importante dizer que, embora prescrito o direito de ação do credor, ou seja, não sendo mais possível cobrar judicialmente a dívida, esta ainda existe e pode ser objeto de cobrança por outros meios: pessoalmente, via telefone, e-mail, carta, etc. Todavia, não poderá ser incluída no SPC/Serasa ou protestada em Tabelionato, tampouco ser cobrada de forma vexatória/ intimidatória ao devedor. Assim disciplina o Código de Defesa do Consumidor:

Art. 43.
§ 5°
Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.


Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Com o vencimento da dívida sem pagamento, o nome do devedor poderá ser incluído no SPC/Serasa a qualquer momento, desde que observado o prazo de 5 (cinco) anos e respeitado o dever da entidade em informar com antecedência o inadimplente acerca da intenção do credor em efetuar a inscrição, face ao não pagamento da dívida. Assim:

Art. 43.
§ 2°
A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.


Não obstante seja obrigatória a notificação do devedor (sob pena de configurar dano in re ipsa, ou seja objetivo), fica dispensada a comprovação, por parte do SPC/Serasa, do recebimento da correpondência por parte do devedor, nos termos do Enunciado de Súmula n.º 404 do STJ, a saber:

É dispensável o Aviso de Recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros.

Todavia, uma vez ultrapassado o prazo de 05 (cinco) anos, a anotação referente à dívida deverá ser excluída imediatamente, o que muitas vezes ocorre de forma automática pelo programa utilizado pelo SPC/Serasa. Caso não seja, o consumidor poderá ajuizar demanda visando a imediata exclusão indevida bem como a reparação civil pelos danos morais oriundos da não exclusão, em virtude do abalo de crédito que lhe foi causado. Neste caso, deverá ser observado o teor do Enunciado de Súmula n.º 385 do STJ:

Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.

Há de se referir que, uma vez quitada a dívida, o responsável pela inscrição terá o prazo de 5 (cinco) dias, a contar do efetivo pagamento, para retirar a anotação negativa junto ao SPC/Serasa, sob pena de responder por danos morais. Referido prazo consta do § 3.º do artigo 43 do CDC, vejamos:

Art. 43.
§ 3°
O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas.


Atente-se para o seguinte aspecto: no momento em que as partes firmam acordo, uma nova dívida é criada (o que o direito denomina "novação da dívida") e a anotação referente ao anterior inadimplemento deverá ser imediatamente retirada dos órgãos de proteção ao crédito. Porém, em havendo novo inadimplemento, o nome do devedor poderá ser novamente inscrito nos cadastros mantidos pelo SPC/Serasa, reiniciando a contagem do prazo de 5 (cinco) anos, a partir da data de vencimento sem o devido pagamento.

Com relação às dívidas oriundas de contratos com parcelamento do total (tais como o financiamento), cada parcela não paga na data prevista poderá ser objeto de inscrição no SPC/Serasa, sendo contado o prazo de 5 (cinco) anos individualmente.

A exceção fica por conta daquelas avenças que possuem "cláusula de vencimento antecipado", ou seja, quando o inadimplemento de uma ou mais parcelas (o que varia de contrato para contrato) acarreta a possibilidade de cobrança antecipada do TOTAL faltante, quando o prazo para inscrição nos órgãos de proteção ao crédito será o da data em que o consumidor deixou de pagar a(s) parcela(s), podendo ser realizada uma única anotação no SPC/Serasa contendo o valor total faltante.
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Maiores informações no site do SPC:

https://www.spcbrasil.org.br/

domingo, 18 de agosto de 2013

Bancos e serviços essenciais gratuitos

Muitos consumidores não sabem, mas desde que entrou em vigor a Resolução 3.518/2007 do CMN (Conselho Monetário Nacional) e Bacen (Banco Central), os titulares de conta corrente aberta em todas as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar no país passaram a ter direito a um pacote de serviços essenciais gratuitos.

Não obstante os bancos possam cobrar tarifas para os serviços prestados (em regra denominados "pacotes" ou "cestas de serviços"), referida norma criou a figura de um plano básico, sem qualquer custo mensal para seus clientes (ou seja, os serviços prestados pelo banco não são remunerados pelos correntistas), com exceção da possibilidade de cobrança de tarifa de renovação cadastral.

A esmagadora maioria dos gerentes de banco não informam a existência de tal direito aos seus clientes, seja por desinteresse ou até mesmo desconhecimento da Resolução. Dessa forma, muitas vezes os consumidores acabam pagando um valor elevado para contar com pacotes completos cujos benefícios sequer lhes são conhecidos, que dirá utilizados. 

Assim, em sendo interesse do consumidor a isenção das tarifas, é necessário o requerimento junto à instituição, o qual sugere-se seja feito por escrito e em 2 vias, uma delas servindo como protocolo, a qual deverá ser assinada, carimbada e datada pelo gerente da agência bancária em que foi aberta a conta corrente.

Nos termos da Resolução n.º 3.919/2010, que revogou (substituiu) a de n.º 3.518/2007, os bancos não podem realizar a cobrança dos seguintes serviços essenciais (contas titularizadas por pessoas físicas):


Relativamente à conta corrente de depósito à vista:
  • fornecimento de cartão com função débito;
  • fornecimento de segunda via do cartão de débito, exceto nos casos decorrentes de perda, roubo, furto, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição emitente;
  • realização de até quatro saques, por mês, em guichê de caixa, inclusive por meio de cheque ou de cheque avulso, ou em terminal de autoatendimento;
  • realização de até duas transferências de recursos entre contas na própria instituição, por mês, em guichê de caixa, em terminal de autoatendimento e/ou pela internet;
  • fornecimento de até dois extratos, por mês, contendo a movimentação dos últimos 30 dias por meio de guichê de caixa e/ou terminal de autoatendimento;
  • realização de consultas mediante utilização da internet;
  • fornecimento, até 28 de fevereiro de cada ano, do extrato consolidado, discriminando, mês a mês, os valores cobrados no ano anterior relativos a tarifas;
  • compensação de cheques;
  • fornecimento de até dez folhas de cheques por mês, desde que o cliente reúna os requisitos necessários à utilização de cheques, conforme a regulamentação em vigor e condições pactuadas; e
  • prestação de qualquer serviço por meios eletrônicos, no caso de contas cujos contratos prevejam utilizar exclusivamente meios eletrônicos.

Relativamente à conta de depósito de poupança:

  • fornecimento de cartão com função movimentação;
  • fornecimento de segunda via do cartão, exceto nos casos de pedidos de reposição formulados pelo correntista, decorrentes de perda, roubo, furto, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição emitente;
  • realização de até dois saques, por mês, em guichê de caixa ou em terminal de autoatendimento;
  • realização de até duas transferências, por mês, para conta de depósitos de mesma titularidade;
  • fornecimento de até dois extratos, por mês, contendo a movimentação dos últimos trinta dias;
  • realização de consultas mediante utilização da internet;
  • fornecimento, até 28 de fevereiro de cada ano, do extrato consolidado, discriminando, mês a mês, os valores cobrados no ano anterior relativos a tarifas; e
  • prestação de qualquer serviço por meios eletrônicos, no caso de contas cujos contratos prevejam utilizar exclusivamente meios eletrônicos.


A Resolução n.º 3.919/2010 determina, em seu artigo 15, que  obrigatória a divulgação pelas instituições mencionadas no art. 1º, em local e formato visíveis ao público no recinto das suas dependências, bem como nos respectivos sítios eletrônicos na internet, das seguintes informações relativas à prestação de serviços a pessoas naturais e pessoas jurídicas e respectivas tarifas: I - tabela contendo os serviços cuja cobrança de tarifas é vedada, nos termos do art. 2º; (...)"

Importante ressaltar que, em sendo utilizados serviços a maior do que os disponibilizados gratuitamente, os correntistas deverão arcar com o pagamento de tarifa individual, cujos valores constam em tabela expedida pelo Banco Central. 

Por este motivo, a decisão de migrar para o pacote de serviços básicos deve ser muito bem pensada e calculada pelo consumidor, uma vez que o somatório dessas tarifas individuais pode gerar um montante superior ao das cestas ofertadas pelos bancos, fazendo com que deixe de ser interessante a migração.
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Leia mais em:

FAQ - Tarifas bancárias

http://www.bcb.gov.br/?TARIFASFAQ


Resolução n.º 3.919

http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/res/2010/pdf/res_3919_v4_L.pdf


 

domingo, 11 de agosto de 2013

Dia do Advogado

Cursava a 7.ª série quando escolhi minha profissão. Aos 15 anos, tive meu primeiro contato com um Código e, aos 17, prestei vestibular. Com apenas 23 me formei sabendo que não seria nada fácil... mas não imaginava que o caminho seria tão árduo.

Nestes 8 anos de OAB, o que de mais importante aprendi é o quanto a coragem, a garra e a obstinação são fundamentais para o exercício da advocacia, e o quanto a ética, o comprometimento com a causa do cliente e a paixão pela profissão fazem toda a diferença na atuação em Juízo.

Das poucas certezas que tenho na vida, uma delas é de que amo ser advogada. A todos os colegas que compartilham do mesmo sentimento...

FELIZ NOSSO DIA!




 

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Aplicação do artigo 45 da Lei n.º 8.213/91 a outros benefícios do INSS

A Lei n.º 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, ao tratar da aposentadoria por invalidez, assim prevê:

Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).

Pelo que se extrai da norma, todo aquela pessoa aposentada por invalidez que seja acometida por doença ou deficiência que lhe faça necessitar de cuidados constantes de terceiros tem direito a um aumento de 25% (vinte e cinco por cento) no valor de seu benefício previdenciário.

A pergunta que imediatamente surge é: e os outros segurados? Caso precisem de assistência permanente de outra pessoa, também estes terão direito ao acréscimo? Em uma interpretação literal da lei, a resposta é NÃO, pois o artigo 45 dispõe expressamente que o aumento se dará apenas ao aposentado por invalidez.

Todavia, uma análise da questão pelo viés constitucional faz surgir uma perspectiva de SIM. Isso porque a Carta Magna, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais, assim prescreve:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

Logo, nos parece evidente que fere o princípio da igualdade/ isonomia assegurado pela Constituição Federal de 1988 a não concessão da complementação do valor da aposentadoria no percentual de 25% aos demais segurados que também custearam a Previdência (leia-se: aposentados por tempo de contribuição, por idade ou regime especial). Ademais, resta atingido também o princípio da proteção à dignidade humana, que é o cerne do ordenamento jurídico pátrio.

Embora não seja reconhecida pelo INSS, que nos pedidos administrativos que lhe são encaminhados aplica o artigo 45 em sua literalidade, ou seja, apenas para os casos de aposentadoria por invalidez, a tese em matéria previdenciária ora apresentada tem sido acolhida pelos Tribunais Regionais Federais (TRF's).

Inclusive, é de autoria do Senador Paulo Paim (RS) o Projeto de Lei do Senado (PLS) n.º 270/2004, que visa alterar o artigo 45 da Lei n.º 8.213/91 para que passe a contar com a seguinte redação:

"Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez, por idade, por tempo de contribuição e da aposentadoria especial do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa, por razões decorrentes de doença ou deficiência física, será acrescido de vinte e cinco por cento.”

Referido PLS aguarda votação na Câmara dos Deputados desde 2006.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Indenização punitiva (dano social) para Operadora de Planos de Saúde

Não raro nos deparamos com desabafos nas redes sociais ou ouvimos de amigos e conhecidos reclamações acerca do plano de saúde de que são conveniados. Ao que parece, a cada dia aumenta a insatisfação dos usuários, tanto em relação ao atendimento prestado nas unidades quanto na negativa de internamento hospitalar e autorização para realização de procedimentos, pelas mais diversas razões.

Vem do Tribunal de Justiça do estado de São Paulo decisão inovadora que condenou a empresa Amil em danos morais coletivos (dano social), cuja indenização foi arbitrada em R$ 1 milhão, valor este objeto de bloqueio judicial e que será repassado ao Hospital das Clínicas de São Paulo.

Referido acórdão foi proferido por ocasião do julgamento de recurso de apelação interposto por conveniado insatisfeito com o baixo valor da reparação civil fixada pelo Juiz singular, na quantia de R$ 5 mil. A ação foi movida pelo segurado em virtude da negativa de cobertura de internação hospitalar quando este sofreu um infarto, tendo como justificativa o não cumprimento do período de carência pactuado no contrato, que é de 02 (dois) anos. Ocorre que a situação era de urgência, o que afasta de plano a aplicação da cláusula invocada pela Operadora. Logo, evidente o abuso da empresa em negar atendimento ao conveniado.

No que diz respeito ao valor considerável da indenização punitiva, o Relator do recurso, Desembargador Teixeira Freitas, referiu que o montante elevado teve como base as inúmeras e repetitivas queixas apresentadas por beneficiários da Amil relativamente à mesma situação, pelo que se buscou uma maior efetividade na condenação da Operadora (responsabilidade civil).

No decorrer de seu voto, o Relator justifica sua decisão nos seguintes termos:

"Afinal, ainda que sabedoras do posicionamento legal e judicial sobre alguns temas relacionados à saúde do segurado, as seguradoras, sempre com uma mesma tese defensiva, continuam a retardar não só esses feitos derivados de injusto comportamento, mas, de maneira reflexa, acabam por afetar outros milhares, de pessoas, segurados ou não, que buscam a solução para um direito.
Nesse rumo, visando coibir esta atitude que desencadeia em incontáveis ações sobre um mesmo assunto, já estudado e pacificado, e, com a intenção de dar fim a causas que se arrastam com o exclusivo escopo procrastinatório, este relator passa a adotar uma postura repressiva de forma a preservar o que é do interesse coletivo, então prestigiando a reparação do dano moral social."

No julgamento do recurso, também houve a majoração do valor da indenização individual do conveniado para R$ 50 mil. A empresa ainda foi condenada por litigância de má-fé, por recorrer de decisão cujo entendimento já se encontra pacificado na jurisprudência do TJSP e do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

(Apelação Cível n.º 0027158-41.2010.8.26.0564).

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Big Brother, 1949. Prism, 2013.

Tão logo soube da notícia de que a Casa Branca possui um programa de grampeamento/ monitoramento clandestino de e-mails, documentos de áudio e vídeo, mensagens de texto e ligações telefônicas realizadas no globo terrestre (denominado "Prism"), em evidente violação à soberania dos Estados e privacidade dos cidadãos do mundo inteiro, imediatamente fiz a conexão com o clássico "1984", de George Orwell, publicado em 1949.

Em síntese, no livro (mais tarde transformado em filme), os cidadãos da fictícia Oceania viviam sob um regime totalitário e repressivo, sendo constantemente monitorados por meio das denominadas "teletelas". Vigiados e rastreados pelo Grande Irmão (Big Brother), inclusive na intimidade de seus lares, o "partido" (Ingsoc) era onipresente na vida da população. O personagem principal, Winston Smith, era um homem comum que, em certa feita, foi capturado pela "polícia do pensamento".

De início, resistiu bravamente à tortura física e psicológica a que era submetido sistematicamente. Todavia, em dado momento, ao ser confrontado com seu pior pesadelo, não mais conseguiu lutar e acabou se entregando ao sistema. No filme, não há como não se sentir afetado com a dramaticidade da cena em que, no meio de um angustiante  interrogatório, completamente privado de sua independência e capacidade de raciocínio lógico, Winston sucumbe e confirma que 2 + 2 = 5.

A denúncia acerca da existência do "Prism" foi realizada por um ex-técnico em segurança digital da CIA a dois jornais americanos, que comprovou documentalmente suas assertivas. Segundo Edward Snowden, empresas como Microsoft, Yahoo, Google, Facebook, PalTalk, AOL, Skype, YouTube e Apple prestam informações ao governo norte-americano sempre que solicitado. Acusado de traição pela revelação de atos altamente secretos, Snowden refugiou-se em Hong Kong antes do escândalo estourar e atualmente encontra-se em Moscou, à espera da concessão de asilo político, requerido a diversos países. Para seus admiradores, um verdadeiro herói; para os EUA, um bandido procurado.

Muito embora o governo americano aduza que a intenção do programa é a manutenção da segurança nacional, através da criação de um banco de dados mundial para futuras investigações, visando a identificação e eliminação de grupos terroristas, a realidade é que, independentemente dos motivos, estamos todos expostos - Big Brother is Watching You ("o Grande Irmão está te observando").

A Wikipedia, ao fazer referência ao livro de George Orwell, explicita que "o romance se tornou famoso por seu retrato da difusa fiscalização e controle de um determinado governo na vida dos cidadãos, além da crescente invasão sobre os direitos do indivíduo."

Vendo assim, não parecem evidentes as semelhanças entre ficção e realidade?
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Nineteen Eighty-Four (1984) na Wikipedia:

quarta-feira, 26 de junho de 2013

De 20 Centavos à Reforma Política

20 centavos. A onda de manifestações que invadiu as ruas do nosso país há alguns dias começou em virtude de uma reivindicação dos usuários de ônibus: a diminuição de 20 centavos no valor da passagem. Ao perceber a força que o movimento estava tomando, uma multidão de brasileiros aderiu à causa e passou a cobrar do Governo uma resposta a outros temas latentes: mais saúde, mais educação, menos corrupção, menos impostos, menos bolsas assistenciais, não à PEC 37 (proposta de emenda constitucional que retira os poderes investigatórios do Ministério Público) e não à PEC 33 (que submete ao Congresso Nacional decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal, que é a última instância do Judiciário brasileiro), gastos exorbitantes com a Copa do Mundo, dentre outros.

Os protestos estão ocorrendo praticamente todos os dias da semana e em todo o território nacional: seja nas capitais, regiões metropolitanas ou pequenas cidades do interior, são 500, 10.000 ou 50.000 pessoas fazendo ecoar a sua voz, bradando o lema "vem pra rua". Embora a grande maioria dos inconformados sejam jovens, há pessoas de todas as idades participando do movimento.

Não há dúvidas de que a esmagadora maioria dos manifestantes está atuando de forma pacífica e organizada, mas o que tem "chamado a atenção" da mídia parcial e atraído todas as lentes é justamente a meia dúzia de arruaceiros e vândalos que estão pegando carona no movimento democrático para fazer o que sabem melhor: praticar crimes (destruição do patrimônio público e privado jogando bombas, arrombando lojas e bancos, ateando fogo em lixeiras). A estas laranjas podres devem ser aplicados todos os rigores da lei, nada menos do que isso.

Dizem que o povo acordou, mas não é verdade. Muitos movimentos e marchas ocorrem no país há tempos, de forma isolada e sem maior projeção em jornais e televisão. A realidade é que o grande público finalmente se uniu, saindo da plateia pra virar protagonista da História do Brasil. Cansado de pagar impostos sem retorno, de não ter saúde e educação de qualidade, ao passo que políticos esbanjam dinheiro público a olhos vistos, em evidente deboche ao povo, sob um falso manto de legalidade (sempre há uma justificativa para aumento de salários e autorização para despesas), o povo trabalhador simplesmente CANSOU.

Discordo de algumas atitudes tomadas pelos manifestantes, como fechar uma rodovia da importância da BR 116 durante horas a fio, exatamente no momento em que milhares de pessoas estão retornando para suas casas depois de um dia inteiro de trabalho. Tolher o direito de ir e vir dos cidadãos por períodos prolongados de tempo nada acrescentará ao movimento. Pelo contrário, atrairá falta de simpatia e até mesmo a ira dos mais exaltados (não sem razão). O protesto deve ser direcionado ao centro do poder, ao local em que estão os governantes, a quem efetivamente se dirige o descontentamento da massa, e a quem deve ser entregue um documento contendo a pauta (ainda que sucinta) de tudo o que está sendo reivindicado, sob pena de esvaziamento do ato.

Após dias e dias de um silêncio sepulcral, nossa Presidenta, acuada pelos acontecimentos e com os holofotes do mundo inteiro voltados para o Brasil, resolveu fazer um pronunciamento em rede nacional que, a meu ver, não trouxe nenhum alento à população (apesar de utilizar muitas frases de efeito). Neste momento, acena com a possibilidade de realização de um plebiscito para tratar da instauração de uma assembleia constituinte... o que poderá ser ainda mais desastroso ao país. Importante esclarecer que a pretendida reforma poderá se dar simplesmente através de leis e emendas à Constituição Federal de 1988. Logo, não há necessidade de se inaugurar um poder constituinte para tratar de um tema específico (reforma política), especialmente diante do fato de que seu caráter originário é ILIMITADO e INCONDICIONAL, o que poderia sair e muito do controle, rompendo com toda a ordem estabelecida.

Otimista por natureza, espero sinceramente que algo de bom aconteça, pois nosso país precisa e merece ser sacudido. O facebook, rede social por vezes tão mal utilizada, teve um papel fundamental para a difusão de ideias e reunião de pessoas nesse momento histórico. Para muito além desse grito de "basta!" à política nacional, desejo que nosso povo crie consciência, de modo a que mostre nas urnas seu real desejo de mudança. Somente com o voto poderemos alterar este cenário desolador. Estejamos atentos e vigilantes. A luta continua. E como diz nosso belo hino riograndense, "povo que não tem virtude, acaba por ser escravo".

PARA O ALTO E AVANTE, POVO BRASILEIRO!