No início do mês, entrou em vigor a Lei n.º 14.181/2021, que trouxe importantes alterações no Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90) e no Estatuto do Idoso (Lei n.º 10.741/2003), no que diz respeito à prevenção e tratamento do superendividamento, a partir de uma ideia de crédito responsável.
Nos termos dos §§ 1.º e 2.º do recém adicionado artigo 54-A à lei consumerista,
§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
§ 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.
Consigna-se que, nos termos do § 3.º, a nova lei não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.
Quanto ao tema, também o artigo 6.º do CDC, que trata dos direitos básicos do consumidor, passou a contar com os seguintes incisos:
XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas;
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
O artigo 52 da Lei n.º 8.078/90 dispõe acerca de uma série de informações que deverão ser obrigatoriamente disponibilizadas ao consumidor de forma prévia, adequada, clara e resumida, de fácil acesso (e compreensão), no próprio contrato, na fatura ou em instrumento apartado. Em complementação a este dispositivo legal, o artigo 54-A assim determina:
Art. 54-B. No fornecimento de crédito e na venda a prazo, além das informações obrigatórias previstas no art. 52 deste Código e na legislação aplicável à matéria, o fornecedor ou o intermediário deverá informar o consumidor, prévia e adequadamente, no momento da oferta, sobre:
I - o custo efetivo total e a descrição dos elementos que o compõem;
II - a taxa efetiva mensal de juros, bem como a taxa dos juros de mora e o total de encargos, de qualquer natureza, previstos para o atraso no pagamento;
III - o montante das prestações e o prazo de validade da oferta, que deve ser, no mínimo, de 2 (dois) dias;
IV - o nome e o endereço, inclusive o eletrônico, do fornecedor;
V - o direito do consumidor à liquidação antecipada e não onerosa do débito, nos termos do § 2º do art. 52 deste Código e da regulamentação em vigor.
No tocante ao Estatuto do Idoso, o artigo 96 da mencionada lei prevê como crime a discriminação de pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade. A nova lei inseriu um parágrafo 3.§, que dispõe que não constitui crime a negativa de crédito motivada por superendividamento do idoso.
Já tratamos aqui no ::BLoG:: acerca do Golpe do Falso Empréstimo Consignado e do Limite de Desconto em Empréstimo Consignado (clique nos links para ler os artigos), práticas que muito prejudicam os idosos, indivíduos reconhecidamente hipossuficientes e hipervulneráveis no mercado de consumo. A nova lei proíbe ainda a pressão e assédio sobre esta modalidade de consumidor (assim como os analfabetos, doentes e em estado de vulnerabilidade acentuada).
Uma das mais importantes inovações legais diz respeito à possibilidade de se buscar judicialmente a conciliação nos conflitos oriundos do superendividamento (artigo 104-A e seguintes). Através de uma audiência conjunta, o consumidor apresenta um plano de pagamento a todos os seus credores (o que se assemelha à recuperação judicial de empresas), com prazo de até 05 (cinco) anos para quitação, sempre preservando o mínimo existencial na repactuação de dívidas e também na concessão de crédito.
A Lei n.º 14.181/2021 surge em nosso ordenamento jurídico com o intuito de auxiliar na recuperação financeira daquele consumidor de boa-fé impossibilitado de honrar o pagamento das parcelas contratadas por motivos muitas vezes alheios à sua vontade (doença, desemprego) e evitar a sua exclusão social, resgatando sua dignidade e poder de compra, através de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento.
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