Em 17 de dezembro passado, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da vacinação compulsória no país. Conforme entendimento da maioria dos Ministros, o Estado pode determinar a obrigatoriedade da imunização de toda a população, inclusive contra a Covid-19.
Entretanto, não é possível lançar mão de medidas invasivas (como o uso da força) para tanto, mas apenas medidas indiretas - a serem impostas pela União, Estados e Municípios -, como a aplicação de multa, restrição da presença em certos lugares ou o exercício de determinadas atividades àqueles cidadãos que se recusarem a serem vacinados contra a Covid-19.
Com relação às crianças e adolescentes, restou definido que, independentemente de suas convicções morais, religiosas ou filosóficas, os pais são obrigados a levar seus filhos menores para serem vacinados, em observância ao calendário de imunização determinado pelas autoridades sanitárias. Neste caso, o Poder do Estado se sobrepõe ao poder familiar dos genitores e/ou responsáveis legais.
TESES FIXADAS PELO STF
Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587:
(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, facultada a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade; e sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente.
(II) Tais medidas, com as limitações expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.
Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1267879:
“É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, tenha sido incluída no plano nacional de imunizações; ou tenha sua aplicação obrigatória decretada em lei; ou seja objeto de determinação da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”.
Aqui no BLoG, já escrevemos uma série de 03 (três) artigos sobre os Direitos Fundamentais (clique nos links para ler): Os Direitos Fundamentais, em que discorremos sobre a definição e características, e fizemos uma pequena análise do catálogo constitucional; Os Direitos Fundamentais – II - em que tratamos sobre hipóteses de conflito entre 2 (dois) direitos fundamentais; e Os Direitos Fundamentais - III - em que apresentamos os direitos fundamentais em espécie.
Conforme exposto nos artigos, todos os direitos fundamentais – individuais, sociais, políticos, culturais, econômicos, ambientais – possuem a mesma escala de importância. Em havendo conflito entre dois ou mais direitos/ princípios, o julgador terá de adotar os critérios da ponderação, da razoabilidade e da proporcionalidade na análise da situação, para assim aplicar o melhor direito ao caso concreto.
No caso da vacina, nos parece evidente a aplicação da regra de Direito Administrativo que determina a supremacia do interesse público (assegurar o direito à vida, à saúde, à erradicação de doenças) sobre o privado (autodeterminação, disposição sobre o próprio corpo). Ou seja: o direito coletivo está acima do direito individual.
O fenômeno da polarização política extremada em nosso país nos últimos
tempos certamente é o maior responsável pelo debate sobre a vacinação. O tema,
que talvez fosse inquestionável há alguns anos, hoje causa controvérsias e
discussões ferrenhas (e até mesmo irracionais) por parte da população que, com
“fundamento” em incontáveis fake news
veiculadas nas redes sociais, acreditam fielmente na possibilidade de que a
vacina será capaz de alterar o DNA humano, ou de que será utilizada como meio para implantação de um chip
para rastrear as pessoas.
O radicalismo de alguns grupos, que dividem a sociedade de forma simplista - ou é AMIGO (aquele que pensa igual a mim) ou é INIMIGO (porque discorda de mim) -, gerou um
antagonismo nunca antes visto, trazendo consigo uma onda de intolerância e intransigência para com o diferente que se mostra incapaz de um diálogo inteligente, em uma completa aniquilação do pensamento dissonante.
E isso vem ocorrendo desde o início da pandemia do coronavírus, quando parte da população passou a questionar a necessidade de utilização de máscaras e álcool em gel para a proteção individual, a adoção do distanciamento/ isolamento social visando conter a disseminação e contágio pelo vírus, o fechamento do comércio e escolas, entre outras medidas. Outro ponto que gerou bastante discórdia foi o uso (controverso) do kit covid, contendo hidroxicloroquina e ivermectina, distribuído gratuitamente em alguns Municípios brasileiros. A triste realidade é que foi politizada uma questão de saúde pública = a busca por SALVAR VIDAS, o que deveria ser preocupação de todos, independentemente das bandeiras de direita x esquerda, tendo sido criada uma disputa de ideologias que se mostra cega, irrelevante e estéril.
Importante lembrar que nenhuma vacina é lançada e distribuída no mercado sem que tenham sido feitas dezenas de testes por laboratórios com credibilidade e haja segurança científica em sua aplicação - especialmente no caso da covid-19, em que bilhões de pessoas no planeta esperam ser imunizadas.
Que as paixões políticas sejam deixadas de lado e a racionalidade vença. Pelo bem de todos e pela erradicação deste vírus que já ceifou milhões de vidas.
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Dica de leitura sobre o assunto:
Vacinação obrigatória, liberdade e pandemia